terça-feira, 30 de junho de 2009

Palmas para Palmas

A única capital no Brasil que eu ainda não conhecia, e sequer tinha pousado! Estive em Palmas este fim de semana e fiquei muito bem impressionado com a cidade. A cidade foi planejada para ser a capital do Tocantins, e foi inaugurada em maio de 1989, e hoje é considerada a segunda cidade mais segura do Brasil. Chegamos à noite, então não deu para ver direito a cidade, mas na manhã seguinte fui pedalar junto com a tripulação em bicicletas emprestadas pelo hotel. Pedalamos 20 quilômetros! Cruzamos uma ponte que tem 8 quilômetros sobre o lago que tem lá. Este lago foi construído pelo alargamento do Rio Tocantins, possui praias e ilhas com infra-estrutura para lazer. Temperatura elevada durante o dia, ruas e avenidas largas e com muita natureza ao redor. Não longe da cidade há uma serra, que deve proporcionar bons passeios, além de cachoeiras. Além, há a área do Jalapão que fica a cerca de 2 horas de carro, e tem paisagens maravilhosas. Quero voltar para Palmas,e ficar pelo menos 3 dias para poder conhecer melhor a região. Na saída fizemos um belo sobrevoo da cidade, e aí sim, deu para apreciar o visual do lago, da serra e do rio Tocantins. Uma beleza, palmas para Palmas!

sexta-feira, 26 de junho de 2009

Preso em Chapecó

A primeira vez que estive em Chapecó foi em janeiro de 1986 quando era copiloto de Bandeirante na Rio Sul. Voava principalmente pelo interior do Rio Grande do Sul e Santa Catarina, sendo que especialmente no inverno havia o problema de nevoeiro na região serrana de Santa Catarina. Os aeroportos de Lages, Criciúma, Joaçaba e Chapecó fechavam para pousos devido ao "teto" e visibilidade baixa, e muitas vezes só abriam no dia seguinte. Vinte e poucos anos se passaram e parece que pouco mudou. Mesmo com o avanço da aviação, com aviões mais modernos, sistema de pouso por GPS, o clima naquela região continua fechando os aeroportos. Esta semana fiquei retido em Chapecó. Pousamos as 3 da tarde com tempo encoberto, garoa fina e 13 graus de temperatura. A programação era para pernoite, decolando as 5:30 da manhã seguinte. Porém o avião que deveria ter pousado naquela noite por volta de meia noite, não encontrou condições adequadas de teto e visibilidade, retornando a Florianópolis. Quando o telefone tocou por volta de 2 da manhã, com a informação que o voo programado para as
5:30 tinha sido cancelado, foi de certa forma ótimo. Pensei: -Vou dormir até mais tarde sem ter que sair da cama as 4 da matina, que bom! A nova programação seria para decolar as 3 da tarde, mas isso se, e somente se, o avião conseguisse o pouso! Pela manhã, ao olhar para o céu por volta das 10 horas, não apenas não tinha a menor condição para o pouso, pois as nuvens estavam baixas, e a visibilidade bastante restrita, como não parecia que iria ocorrer uma melhora nas próximas horas. O jeito era já se preparar para mais um dia inteiro em Chapecó! Lavar cueca, meia e já saber de uma lojinha para comprar uma camiseta. A cidade é pequena, com cerca de 200 mil habitantes, e economia voltada para suinocultura e avicultura, sendo que Perdigão e Sadia estão fortemente presentes na vida de Chapecó. A região central é calma, não se ouve buzinas, os carros param na faixa dando preferência ao pedestre. Por falar em carros, ao contrário de São Paulo, lá se compram carros vermelhos! Vários deles nas ruas, o que não acontece aqui, onde os carros são pretos ou prata com leves variações. Já houve ocasiões em que a tripulação ficou retida por mais de 2 dias, aguardando a melhoria do tempo. Região de serra, baixa temperatura e muita vegetação favorecem à formação de nevoeiros. Mas por volta de 1 da tarde o tempo melhorou, e o aeroporto abriu, permitindo que o avião, vindo de Floripa, pousasse. O aeroporto de Chapecó, é muito pequeno! Mal cabem dois aviões de médio porte. A sala de embarque é tão reduzida, que na medida que os passageiros entram, eles abrem a porta que dá acesso ao pátio dos aviões para escoar o excesso e caber todos no salão. Também o pátio é pequeno, então quando o trator empurra o avião em manobra para a partida, ele já o posiciona dentro da pista! É necessário uma prévia coordenação com a torre. A tripulação que chegou e nos passou o avião, foi para o hotel já sabendo que na manhã seguinte provavelmente o mesmo iria acontecer, ou seja, aeroporto fechado, voo cancelado. Decolamos lotados de lá, pois embarcaram os passageiros do voo da manhã que não saiu e os passageiros do voo da tarde. Veja no Google a imagem do aeroporto.

<http://maps.google.com.br/maps?f=q&source=s_q&hl=pt-BR&geocode=&q=aeroporto+de+chapec%C3%B3&sll=-13.410994,-50.449219&sspn=76.916901,171.738281&ie=UTF8&ll=-27.132938,-52.660518&spn=0.009281,0.020964&t=h&z=16>

quinta-feira, 18 de junho de 2009

Me aproximando dos aviões

A partir de 1979 as oportunidades para viajar de avião foram surgindo. Com 2 colegas de colégio fomos a Atibaia, onde um deles conhecia um japonês que era dono de um hangar no aeroporto da cidade. Lá, o tal do japonês nos levou para um passeio a bordo de um pequeno monomotor. Foi fantástico! Rasante sobre o lago, curvas radicais, subidas abruptas e um belo visual. Também em 79, com minha mãe e irmãos, viajamos para a Disney. O voo, que deveria ser num DC-10, acabou sendo de Boeing 707, pois naquelas semanas (maio de 79) antes da viagem, um DC-10 da American Airlines, decolando do aeroporto de O'Hare - Chicago, caiu logo após sair do chão! O motor esquerdo, que era preso à asa por três pinos de fixação, simplesmente se soltou. O problema foi em um dos pinos, então por umas semanas, toda a frota de DC-10 no mundo ficou no chão para os devidos reparos. Tanto a viagem de ida quanto a de volta, foram a maior curtição! Não devo ter dormido um instante sequer! Curti o serviço de bordo, bati papo com as comissárias, entrei e sai da cabine dos pilotos diversas vezes. Lembro até hoje o nome dos comandantes da Varig, naqueles voos: Sapateiro na ida, e Pprints na volta. Vale umas palavras sobre o Boeing 707: Embora não tenha sido a primeira aeronave a jato a operar vôos comerciais, ele foi o primeiro Boeing a ter grande sucesso de vendas, já que até então, a Boeing se concentrava no segmento militar, e foi a primeira aeronave da série 7X7. Possuindo 4 motores, e com suas grandes asas repletas de querosene, seria possível voos mais longos que no passado. A primeira empresa aérea a operá-lo foi a Pan Am, realizando a rota Nova Iorque-Paris em outubro de 1958. Sua produção se encerrou em 1978, e até hoje presta bons serviços mundo à fora. Em sua versão de passageiros, transporta até 185 passageiros, sendo a classe turística com 3 poltronas, corredor e mais três poltronas. Por ter grande alcance, mudou as viagens internacionais, pois não era necessário parada para reabastecimento em escalas intermediárias. Foi o avião oficial dos presidentes de vário países, incluindo os EUA, e até pouco tempo atrás, do Presidente Fernando Henrique. Hoje em dia ainda é usado, principalmete na versão cargueira. Sua fuselagem foi também usada nos Boeings 737 e 727. Em dezembro de 1981, mais uma vez viajei de 707, indo para Manaus com meu pai. De lá fomos a Porto Velho, onde voávamos para minas de cassiterita, situadas a cerca de 50 minutos de voo num Piper Azteca, bimotor para 6 passageiros. Na volta ficamos retidos em Rondônia por conta de uma greve dos aeronautas, então após 2 dias parados em Porto Velho, voltamos em um Learjet fretado. Avião muito bacana, mas apertado a beça para uma viagem tão longa. Em 1980 acompanhei meu padrinho que foi passar um dia na fábrica da Embraer. Ele foi à trabalho, e eu aproveitei para passear. Foi muito legal conhecer a fábrica com suas linhas de montagens. No final ainda ganhei uma sacola com "brindes" da Embraer, foi como que um presente de aniversário aquele passeio. Obrigado tio Valdemar! Em outra ocasião a Embraer colocou à disposição da empresa em que meu pai trabalhava, um avião Bandeirante para um vôo a São João del Rey. O avião, que era da própria Embraer para uso da diretoria, tinha prefixo PT-EMB, era pintado de azul degradê, e era a própria imagem da Embraer. Tirei uma foto na cabine, e o interessante é que 5 anos e 1/2 mais tarde pude tirar outra foto também no Bandeirante da Rio Sul, mas desta vez eu era o co-piloto! Em julho de 1981, fui para a Argentina em viagem de férias. Viajamos de Airbus A-300 da Cruzeiro, decolando de Congonhas. Avião novo e grande, com capacidade para 234 passageiros em 3 classes, podia operar em Congonhas sem restrições. Não acreditaria se dissessem na época que eu pilotaria aquele avião, mas o fato é que em outubro de 1987 eu iniciava o treinamento para voar de copiloto naquele mesmo Airbus! Mas o passeio mais legal que eu fiz, foi em junho de 79 com meu amigo Bullo. Planejamos e pagamos com nossas economias uma passagem de ida e volta para o Galeão. O objetivo era não apenas ver os aviões em geral, mas principalmente para ver o Concorde, que 2 ou 3 vezes por semana pousava lá. Munidos de autorização para viajar desacompanhados, embarcamos em Congonhas para o Galeão. Viajando na condição de menor desacompanhado, tivemos um tratamento diferenciado, sendo que na volta, viajamos na cabine de comando. Passamos o dia inteiro no terraço do aeroporto, vimos o Concorde pousar e decolar, e para voltar, mudamos o voo para ficar mais umas horas por lá. Tiramos várias fotos, sendo apenas uma de nós mesmos e todas as outras de aviões. Voltamos à noite para nossas casas contentes com nosso passeio inusitado. Assim os anos foram passando, sempre que tinha oportunidade ia ao aeroporto de Congonhas, e não perdia uma chance de ir a Viracopos, pois o aeroporto de Guarulhos ainda não atendia à aviação comercial. Assim fui me aproximando dos aviões. Ia muito de carro para Ubatuba, com meu pai e irmãos, e sempre esticava o olhar para o aeroporto local, observando os pequenos aviões que lá estavam estacionados. Saía com os amigos em São Paulo, aguardando o momento de procurar um aeroclube para tirar o Brevet de piloto, que iria acontecer no início de 82, quando ainda tinha 16 anos de idade.








  • Veja que lindo o rasante deste B-707



  • Em 1980, brincando de piloto no Bandeirante PT-EMB



  • Em 1986, trabalhando de copiloto no Bandeirante da Rio Sul



  • Em junho de 79, como menor desacompanhado

quarta-feira, 10 de junho de 2009

Comes e bebes

Uma das coisas legais de sair para voar é curtir os comes e bebes nas escalas em que pousamos. Já em 85/86, quando voava o Bandeirante pelo interior do Rio Grande do Sul e Santa Catarina, aproveitávamos certas escalas, quando ficávamos mais de 30 minutos parados, para tomar um chimarrão e bater papo com o operador da rádio, que fazia as comunicações com os aviões. Mais tarde, na Ponte Aérea, na época do Electra, a cada escala, seja no Santos Dumont, seja em Congonhas, dávamos uma passeada. O tempo no solo entre um voo e outro era grande, de 45 a 60 minutos, então o Comandante do voo e eu sempre saíamos para um cafezinho, ver as moças no saguão, ou mesmo dar um pulo nos escritórios da companhia para resolver uma pendência. Aliás, uma das coisas boas de voar na Ponte Aérea (pelo menos antigamente, pois hoje em dia o tempo de solo é, de um modo geral,muito curto) é que no mesmo dia em que você trabalha, era possível, nestes intervalinhos, resolver assuntos. Dar um pulo do departamento pessoal, emitir uma passagem, passar no setor de uniformes, ir ao banco. Em 88 e 89, passei a pilotar o Airbus (A-300, projeto da década de 70, sem a atual parafernália eletrônica das novas aeronaves Airbus)e os comes e bebes ganharam novos horizontes. Em Salvador comer um acarajé e beber água de côco na Baiana em frente o aeroporto era quase uma obrigação que até hoje cumpro sempre que possível. Em São Luiz do Maranhão não dava para escapar quando um certo Comandante me convidava para beber (e pagar para ele, pois se tinha alguém pão duro, este alguém era ele) o famoso Guaraná Jesus! Mistura de Tubaína com suco de uva, com uma tonalidade rosa, na verdade não era muito gostoso, mas valia pelo passeio. É bom frisar que alguns aviões, como o Electra e o Airbus A-300 possuiam o Engenheiro de Voo, ou Mecânico de Voo, que ficava na cabine cuidando de tudo. Em Belém do Pará, além dos bombons de cupuaçú (eu não aprecio, mas trazia para casa, pois minha mulher gosta) tem um sorvete de tapioca que é uma delícia. Em Aracajú tem um biscoito sequilho, com formato de castanha de cajú que é muito bom. Em Manaus, para compensar o calor, vale a pena descer do avião para comprar um milk-shake do Bob's. Em Rio Branco, no Acre, nem precisávamos descer, pois embarcava para a tripulação uma dupla que era uma delícia: Um bolinho de aipim e um quibe. Esta dupla frequentemente era levada para o hotel de pernoite, e após aquecer, virava uma bela refeição. Costumamos dizer que vamos comer no restaurante Abajur, ou no Arandela! Embrulha-se o sanduiche, bolinho de aipim ou o que for no papel alumínio e deixa aquecendo junto à lãmpada. Fica perfeito. Economia, conveniência e aproveitamento dos recursos disponíveis. Em Goiãnia tem uma pamonha, que pode ser doce ou salgada, que também faz muito sucesso. Em Recife havia uma barraquinha de frutas em frente ao aeroporto onde valia a pena comprar abacaxi, que era descascado na hora, manga e fruta do conde. Em Ilhéus, fazíamos um esquema interessante, onde quando estávamos a 5 minutos para o pouso, entrávamos em contato com a empresa no aeroporto e pedíamos para alguém atravessar a rua e encomendar os pasteis e caldo de cana para a tripulação, depois era só descer, pagar e pegar a encomenda. E finalmente havia um voo onde um dia fazia escala em Uberaba e no outro em Uberlãndia, e quando abastecíamos de querosene o avião (sempre tinha abastecimento) a Shell presenteava o comandante e o co-piloto com um belo pedaço de queijo para cada um (Uberaba) ou um pote de doce de leite (Uberlãndia). Assim, entre um picolé em Cuiabá e uma rapadura em Teresina, as viagens passavam mais rápidas e divertidas.

segunda-feira, 8 de junho de 2009

Camburão

Alguns voos que terminam no Rio de Janeiro – Galeão, especialmente os que chegam no período da noite e madrugada, nós apelidamos de Caveirão. Já os voos saindo e chegando de Brasília, nós chamamos de Camburão! Se vamos para Brasília na terça feira, ou saímos de lá na quinta, entre a tripulação, comentamos em tom de brincadeira que é melhor ficar de olhos abertos em nossos pertences de mão. Na capital Federal todo mundo é VIP, e é por isso que no aeroporto não há sala VIP! É um tal de Vossa Excelência para cá, Vossa excelência para lá, senadores, deputados,assessores de uns e outros, e também os puxa-sacos. Até pouco tempo atrás (com o escândalo das passagens aéreas foi anunciado que iriam extinguir este “serviço”) havia uma salinha onde funcionava uma secretaria com funcionários do governo só para cuidar do check-in dos parlamentares. Certa vez um político, alto, magro e que continua por lá, se recusou a colocar a poltrona na posição vertical, em preparativo para a decolagem. Talvez achasse que aquela regra de segurança não era aplicável a ele, e não adiantou o anúncio dos comissários, nem o aviso de que com aquela recusa, o Comandante iria ter que voltar e desembarcá-lo. Diante da teimosia do nobre parlamentar, o avião regressou ao estacionamento para que o desobediente saísse do avião, sob o aplauso dos demais passageiros. Outro político, famoso em Pernambuco, também apresentou problemas de comportamento, já que se achou com mais direitos que os demais. Naquela época ainda não havia a lei que proíbe o fumo à bordo, porém uma liminar expedida por um juiz federal proibindo o fumo a bordo estava em vigor. Pois não é que o Excelentíssimo Parlamentar se recusou a apagar o cigarro? Sentado na primeira fileira, ainda desafiou os comissários, dizendo que não havia lei neste sentido, que nem ele nem seus colegas haviam votado lei específica naquele sentido. A tripulação não soube explicar que não era uma Lei, mas uma liminar, que , portanto, tinha força de Lei. Então a tripulação teve que engolir o desaforo e aguentar a reclamação e indignação dos demais passageiros. Hoje em dia o aeroporto de Brasília é muito importante para as empresas aéreas no que diz respeito à distribuição de passageiros(HUB). Muitos voos saem de lá para todos os cantos do Brasil, então em determinados horários chega a ter 35 aviões no pátio, para apenas 13 posições com “pontes de embarque”;e as demais ficam dependendo de serviço de ônibus da Infraero. Fica parecendo uma rodoviária, principalmente porque, como diz a propaganda da Gol, hoje em dia todo mundo pode voar! Não desejo a ninguém ter que embarcar nos horários de pico. Em Brasília há uma rota especial para os aviões seguirem logo após a decolagem. Esta rota consiste em efetuar uma curva à direita logo após a decolagem, para ser evitado o sobrevoo das mansões do lago sul, atenuando então o nível de ruído sobre aquela área. Isso evidentemente aumenta um pouco o percurso para voos que seguem para o norte e nordeste do país, mas pelo menos os ouvidos dos nobres moradores são poupados. Mas é gostoso pousar por lá, Brasília possui o aeroporto comercial mais alto do Brasil, e como a performance dos aviões diminui com a altitude, as pistas lá são bastante longas, a iluminação da cidade dá um belo visual à noite, e o Lago Paranoá, junto com a Ponte JK, compõem um belo postal da cidade.

sexta-feira, 5 de junho de 2009

Sobre o acidente das Air France

Todos os acidentes possuem vários fatores contribuintes, dificilmente um fator isolado pode derrubar um avião. No caso deste último acidente, parece que um dos fatores foi o mau tempo que havia na rota. Pelo que vi na internet esses dias, havia formações meteorológicas muito intensas e cobrindo uma área muito grande. Já voei várias vezes naquela rota, e já vi muito tempo ruim por lá, mas os pilotos sempre encontram uma passagem entre as nuvens de CB's, que se não é um caminho de tempo bom, pelo menos se acha um caminho menos ruim. Toma-se as precauções necessárias (aviso de apertar os cintos; sistema de anti-gelo do avião ligado; anúncio aos passageiros e etc.) e sempre se chega do outro lado. As vezes os desvios devem ser realmente longos, muitas vezes entrando em rotas adjacentes, sendo que ao entrar nas rotas adjacentes, ou obtemos autorização via rádio, ou usa-se procedimentos padronizados de contingência para quando não se consegue o contato rádio para obter tal autorização. Já que falei em comunicação, na região do Atlântico muitas vezes não conseguimos contato com a área de Recife, e principalmente com a área de Dakar, que faz a coordenação em boa parte da região. Já voei mais de 90 minutos na área de Dakar sem conseguir contato com eles. Essas nuvens de CB são realmente grandes e cheias de atividade dentro delas. Correntes de ar ascendentes e descendentes, muito gelo, água e turbulência. São nuvens que sempre evitamos com desvios. Só se entra em uma nuvem dessas se não houver alternativa. Nesses 24 anos voando, sempre encontrei uma alternativa. Na região sul/sudeste do Brasil, freqüentemente há as chamadas “linhas de instabilidade, que são vários CB's que avançam em linha, muitas vezes com centenas de quilômetros de comprimento. Essas frentes vem da Argentina, onde nascem as frentes frias, e avançam rápido, com muita intensidade. Os CB's nesta região não são tão altos como na linha do Equador, mas são muito fortes, então podem ser necessários desvios muito grandes para se atravessar uma linha dessas. Já houve casos de vôos de São Paulo para Buenos Aires, onde o vôo teve que efetuar desvios de 90 graus à esquerda, voando por mais de 200 quilômetros antes de achar uma passagem. Já houve casos do vôo retornar, pois os pilotos julgaram que não havia uma passagem segura, ou que até poderia ter, mas o desvio seria tão grande que aumentaria significativamente o consumo de combustível, inviabilizando a autonomia para se atingir o destino com segurança. Lembro de um caso ocorrido em 1986, onde um vôo de Boeing 727 decolou de Guarulhos com destino a Foz do Iguaçu. Havia um “paredão de CB’s”, uma linha de instabilidade na rota,e o comandante achou um caminho. Um caminho péssimo! Rachou o pára-brisas da cabine, amassou toda a lataria do avião, passageiros passaram mal,teve um início de despressurização, enfim ,foi um filme de horror! Melhor teria sido não ter enfrentado e retornado. O Boeing 727 é um avião ultrapassado, mas um excelente avião, que quase não possui automatismo. A aviões Boeing, mesmo os mais modernos, possuem um automatismo excelente, mas não tira dos pilotos a capacidade de realizar determinadas manobras ou ações. Em 1988 eu voei o Airbus, mas o A-300 que voei na época é um projeto dos anos 70, portanto sem tanto automatismo. Hoje em dia todos os aviões fabricados pela Airbus são muito automatizados, o que,na minha opinião acaba tirando dos pilotos a capacidade de controlar o avião em determinadas situações. Não foi apenas o acidente com o Airbus da TAM em Congonhas, mas vários outros com Airbus onde sempre havia um componente eletrônico que deu defeito. Costumo fazer uma analogia,comparando um automóvel Jeep 84 com um Jeep 2009. Qual é melhor? Bom, o 2009 possui mais conforto, mais economia e sistemas automáticos, ao contrário do 84. Mas qual será o comportamento dele no momento de subir uma ribanceira com terreno irregular? O 84 talvez tenha um câmbio meio duro, mas vai engatar a tração 4x4 e vai seguir em frente. O 2009, vai ter a tração 4x4 dependendo de um comando eletrônico, que vai enviar um sinal para os sistemas das rodas e através de outro componente eletrônico, ativar a tração nas quatro rodas. Uma falha em algum componente vai inviabilizar a manobra, enquanto o 84 já subiu a tal ribanceira. Em minha opinião ,os Airbus são muito automatizados, e isso pode ter sido um fator contribuinte para os pilotos perderem, ou não conseguirem restabelecer o controle do avião ao enfrentar o mau tempo. O próprio radar meteorológico dos aviões possui, hoje em dia, um controle automático do ângulo da antena. A Antena do radar, que fica no nariz do avião, possui um controle, que quando estamos pousados, ajustamos com ângulos de +5 graus para visualizar o céu em busca de nuvens. Ao voar nivelados, ajustamos com ângulo de -1 grau aproximadamente para receber o retorno das formações meteorologias. Voando em tempo ruim, ou mesmo em tempo bom à noite, os pilotos devem ficar constantemente de olho no radar, efetuando ajustes constantes na antena e no brilho e ajuste de retorno de imagens do radar. Há técnicas para o melhor ajuste da antena, e parece que quanto mais antigo o piloto, mais complexo pode ser esse ajuste. Mas com um bom e constante ajuste manual, com certeza consegue-se uma imagem melhor que o ajuste automático. Então,penso que mais uma vez o automatismo pode estar atrapalhando, pois os pilotos podem se tornar complacentes quanto ao controle do radar. Veja o que ocorreu a cerca de 20 dias com o Airbus (igualzinho o da Air France) da TAM na chegada em Guarulhos. Em minha opinião, o avião entrou inadvertidamente onde não deveria ter entrado. Ontem estava conversando com um colega que voa o Airbus A-320, que comentou que realmente há proteções nos sistemas de vôo automático, onde o piloto automático toma ações que os pilotos não tem como interferir, nem desligando o piloto automático! Ele não aceita. Lembram do filme 2001 Uma Odisséia no Espaço? Aviões modernos possuem proteções para o caso de atingir velocidades mínimas ou máximas. Se atingir a velocidade mínima, a potência dos motores é automaticamente aumentada, e o piloto automático comanda uma descida para que a velocidade aumente. De maneira inversa, se atingir a velocidade máxima, a potência será reduzida, e o avião inicia uma subida para que a velocidade seja reduzida. Na linha Boeing, e do MD-11, isso é verdadeiro até que o piloto automático e o sistema de potência automática sejam desligados pelos pilotos. Na linha Airbus não. Mesmo desligando, ou tentando desligar, o automatismo toma conta do vôo! Segurança? Sim, porém esta tirando dos pilotos a capacidade de agir. Os aviões possuem capacidade aerodinâmica para efetuar uma manobra de 360 graus em torno do seu eixo longitudinal. Os Airbus também, mas os computadores não permitem. Ainda sobre CB’s, as vezes na descida e aproximação para pouso temos que passar pertinho deles, e muitas vezes dentro deles. Mas quando isso ocorre, estamos voando mais baixo, por exemplo, a 10 mil pés (em cruzeiro voamos de 31 mil a 41 mil pés de altitude) onde não há formação de gelo, e principalmente onde a diferença entre a velocidade máxima permitida e a mínima é bem grande. Explico: Há uma velocidade mínima para o vôo, onde abaixo dela, o ar que passa sobre a asa teria o fluxo turbilhonado causando a perda da sustentação, e a velocidade máxima, onde algo parecido ocorre. A 10 mil pés, por exemplo, podemos voar a 250 milhas por hora, e a velocidade mínima é de 200 e a máxima de 320, portando em caso de turbulência e variações na velocidade, temos uma boa margem até os limites. Quando o avião sobe, estes limites ficam menores, sendo que a 35 mil pés (nível de vôo do air France), dependendo do peso, as margens para as velocidades mínimas e máximas são pequenas. 15 ou 20 milhas de variação pode ser suficiente para se atingir a mínima ou máxima. Em vôo, antes de aceitarmos um nível de vôo, devemos verificar nosso peso, e se há ou previsão de turbulência, desvio e etc., pois quando efetuamos uma curva, momentaneamente as margens de velocidade diminuem. No caso do Air France, eles devem ter entrado no mau tempo, não acharam uma brecha para passar, talvez não tenham visualizado corretamente o mau tempo à frente através da tela do radar meteorológico. A tripulação era experiente, composta por 3 pilotos.Nestes vôos, exceto na decolagem, subida, descida e pouso, um dos pilotos está descansando em uma caminha fora da cabine de comando, sendo que voando em 3 pilotos o melhor período para se descansar é o período do meio. Possivelmente tudo pode ter se passado no período em que o comandante do vôo estava em seu repouso. Ambos os co-pilotos, o Sênior e o outro, eram experientes o suficiente para saber efetuar os desvios necessários. Talvez tenha havido tempo para que o Comandante saísse de seu descanso para ver o que estava ocorrendo, talvez não. Já comentei que quando não dá para atravessar uma área de mau tempo uma solução é retornar. Nesta rota do Atlântico, nunca ouvi falar em alguém retornar por mau tempo! Se essa possibilidade passou pela cabeça dos pilotos da Air France, deve ter sido descartada. Em mau tempo, com vento e turbulência, a variação da velocidade do avião vai ocorrer, e aí o automatismo vai tentar corrigir. Parece que houve panes elétricas e de pressurização, que não se sabe se foram ou não decorrentes do mau tempo, ou se por causa das panes os pilotos tenham tido que enfrentar os CB’s. Quando há uma falha total dos sistemas elétricos, para que o avião não fique apenas na bateria, existe um sistema onde uma pequena hélice é abaixada da fuselagem do avião para gerar energia para boa parte dos componentes. Não teria funcionado este sistema? Ou os pilotos na cabine não teriam comandado? E se não comandaram, foi por qual motivo? Há que se aguardar as investigações, pois tudo que se disser, são apenas opiniões. Em minha opinião, a Indústria Aeronáutica deveria repensar o excesso de automatismo nos aviões, e agora voando sobre o oceano, os pilotos devem considerar a possibilidade de regresso. Há um adesivo que diz: IF IT’S NOT BOEING, I’M NOT GOING!