domingo, 28 de fevereiro de 2010

Todas as capitais do Brasil

Recentemente estive pernoitando em Teresina. Assim como Palmas, Teresina foi um dos lugares mais quentes em que já estive. Um pernoite rápido, em que só deu tempo de dar uma passeada pela região central da cidade, visitando um mercado de artesanato ali por perto. O que tornou este pernoite especial, foi o fato de que após ter iniciado na aviação em 1982, agora posso dizer que já estive em todas as capitais do Brasil!

As cidades litorâneas obviamente possuem o atrativo da praia. Fortaleza, Natal e Salvador são uns dos pernoites de minha preferência. Mas também é muito legal passear por Campo Grande e Goiânia. Cada cidade tem seu charme e se os colegas da tripulação estão animados, saimos juntos a procura de passeios, mas se o pessoal não está a fim, não tem problema, pois saio sozinho por aí. Em Cuiabá já tive a chance de ir três vezes ao Parque Nacional da Chapada dos Guimarães! Lá está localizada a Cachoeira Véu de Noiva, que é lindíssima. Quando temos o dia inteiro parados em determinada cidade, é comum a tripulação dividir os custos para fazer um passeio a algum lugar mais distante, acompanhado de um motorista-guia. Praia do Francês e Barra de São Miguel em Maceió, Porto de Galinhas em Recife e Guarapari próximo a Vitória, são ótimos destinos, tornando o pernoite mais agradável.

Já me diverti em Rio Branco, assim como em Boa Vista e Macapá. Gosto muito de Belém, onde há várias opções de passeios. O museu Emílio Goeldi, destinado a diversidade biológica e sociocultural da Amazônia é um dos mais antigos do Brasil, fundado em 1866. Além disso, em Belém há a peculiaridade do Mercado Ver-o-Peso, bem em frente ao Rio Guamá, e a região de armazéns junto ao porto que foi restaurada e se transformou em uma área repleta de bares e restaurantes. Gosto de caminhar pelas ruas e observar as mangueiras, que estão espalhadas por toda a cidade. Interessante que estas mangueiras não são nativas da região, foi um prefeito de Belém que há muitos anos atrás mandou que plantassem algum tipo de árvore que pudesse oferecer muita sombra. Ainda sobre Belém e suas mangueiras, é curioso notar que quase todos os carros, inclusive os novos, possuem pequenos amassados na capota e capô. São as mangas que estão sempre caindo!

Em Manaus já fiz ótimos passeios: Porto Flutuante, Encontro das Águas, praias de rios, igarapés e a Zona Franca. Até o início dos anos 90, ir à Zona Franca e aproveitar as boas compras, era quase que uma obrigação do visitante de Manaus. Rádios-relógios, telefones do tipo "flip fone", videocassetes com 4 cabeças, relógios, produtos de beleza e tênis eram os artigos mais procurados pelos tripulantes. Hoje em dia ninguém mais vai à cidade, e o gostoso em Manaus é ficar "largado" no Hotel Tropical. Me sinto em um clube, um verdadeiro spa!

Churrasco e amigos em Porto Alegre, sequência de camarão na Lagoa da Conceição em Florianópolis, e quando no Rio de Janeiro, gosto de tomar um chopp em Copacabana ou encontrar minha sogra, cunhada e sobrinha no Arpoador. Quando estou em Belo Horizonte, não posso deixar de dar um pulo no Mercado Central para voltar para casa com a mala cheia de queijos gostosos, ou se tiver o dia inteiro, fazer um passeio a Ouro Preto. Em Aracajú e João Pessoa, além da tranquilidade do Hotel, também é possível curtir uma praia. Vêr o por do sol junto ao Rio Madeira em Porto Velho é um "must", e quando em São Luís, se não tiver tempo suficiente para conhecer a cidade histórica de Alcântara, pode-se ouvir reggae em qualquer barzinho perto do hotel. Bom também é quando temos a chance de encontrar amigos ou parentes nos pernoites. Em Brasília sempre encontro meu cunhado, em BH minha irmã e em Curitiba os meus primos.

Só o que pode estragar um pernoite é um hotel ruim. Então se o hotel for bom, o pernoite já começou bem! Para o hotel ser considerado bom pelos tripulantes, ele não precisa ser de luxo. Um apartamento limpo, de preferência sem carpete, uma boa vedação à luz e ao barulho já é 70 %. Os outros 30% ficam por conta da localização, café da manhã, piscina e academia.

Além das 27 capitais do Brasil, outras cidades em que eu já pernoitei aqui no Brasil foram: Foz do Iguaçú, Uberlândia, Chapecó, Petrolina, Londrina, Maringá e Itajaí. Mas o meu destino favorito é voltar para São Paulo, a minha Cidade!

terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

O voo 254

O ano era 1989 e eu era co-piloto. Estava efetuando um voo com pernoite em Natal, quando pela manhã do dia 4 de setembro, ao descer para tomar o café da manhã com os demais tripulantes, havia rumores de que um avião da Varig estava desaparecido! O avião era um 737-200 (prefixo PP-VMK) que havia decolado no final da tarde do dia anterior de Marabá com destino a Belém, e horas após o horário previsto de pouso, ainda não havia notícias dele. Foi um longo período de angústia sem saber aonde estava o avião, até que ele foi localizado completamente fora da rota. Havia feito um pouso forçado em plena floresta.

Lembro que fiquei bastante assustado e perplexo com o acidente. Eu conhecia o Comandante daquele voo, pois já havia voado com ele no Electra, e também já havia pilotado várias vezes o PP-VMK, inclusive no vôo 254. Não dava para entender como os pilotos conseguiram se perder daquela maneira em um trecho tão curto.

É bem verdade que o 737-200 possuia sistemas de navegação convencionais, ou seja, não dispunha de GPS ou sistema inercial, que a qualquer momento indica ao piloto a posição geográfica do avião. Também falou-se na ocasião, que a tripulação estava ouvindo o jogo de futebol do Brasil pelo rádio do avião. Além disso, houve também a navegação como fator contribuinte para que a tripulação voasse no rumo errado. O rumo a ser seguido após a decolagem de Marabá era o 027º, porém na navegação impressa que os pilotos recebiam, os rumos possuiam uma casa decimal, assim, o rumo 027 vinha impresso com um zero a mais. Ao visualizar o rumo 027.0 graus, a setagem de proa foi para o rumo oeste, 270º! O voo seguiu na direção completamente errada!

Contudo, foi incrível como eles conseguiram cometer tamanho erro, persistir no erro e ao perceber que algo não estava correto, os pilotos não conseguiram entender qual havia sido a falha inicial. Muitos pilotos ,em algum momento de suas carreiras, já voaram na proa errada, mas sempre por pouco tempo, 30 segundos ou menos, um minuto no máximo até corrigir a proa. No caso do voo 254, quando finalmente o combustível acabou e o pouso na floresta foi realizado, o Comandante acreditava que estava em algum ponto entre Marabá e Belém, mas na verdade eles estavam muito longe, 1,200 km a sudoeste de Marabá, em São José do Xingu, na Serra do Caximbo (MT)! O Comandante teve muita perícia e sorte ao pousar em condições noturnas e com os dois motores já desligados por falta de combustível. Na aterrissagem, com o impacto do avião contra o solo e as árvores, muitas poltronas se soltaram do piso, indo de encontro aos passageiros que estavam na parte da frente do avião. Somente um passageiro morreu em decorrência do pouso, e mesmo assim porque se recusou a colocar o cinto de segurança. Algumas mortes poderiam ter sido evitadas se as equipes de resgate tivessem chegado mais cedo,porém as autoridades concentraram as buscas no eixo Marabá-Belém,já que nos contatos realizados com o vôo 254, o Comandante dizia que estava próximo a uma destas localidades.

Havia um passageiro que embarcara em Marabá que já tinha feito esta viagem várias vezes, e logo após a decolagem, estranhou o fato de que o sol, que já estava próximo ao poente, não estar à esquerda do avião, o que seria natural nesta rota. Ele teria alertado a uma das comissárias sobre este fato, mas esta informação não foi levada a sério pela tripulação. Após o pouso forçado, os sobreviventes montaram um acampamento para aguardar as equipes de resgate, porém passado um tempo, este passageiro que estava acostumado à áreas de mato, decidiu sair em busca de socorro. Não muito longe do acampamento ele viu estrume de gado, e persistindo em sua caminhada, acabou por encontrar uma fazenda. De lá o contato com as equipes de socorro foi realizado, e após 52 horas da queda na floresta, surgiu um helicópero do Esquadrão Pelicano da FAB, de onde soldados desceram por cabos a fim de efetuar o resgate. Dos 54 ocupantes do voo 254, apenas 41 voltaram para casa.

Na aviação, todo acidente ou incidente é usado para aprendizado e prevenção de novas ocorrências; e depois deste acidente, algumas coisas mudaram na Varig. O tempo de permanência do avião no solo entre um pouso e uma decolagem foi ampliado, evitando assim escalas muito curtas, quando fica tudo muito corrido. Cursos de CRM e melhora no preparo de Comandantes instrutores e checadores, além da mudança na formatação das navegações que os pilotos recebem. Outra mudança foi a implementação GPS nos aviões 737-200, tornando-os mais confiáveis em termos de sistemas de navegação. Além disso, e talvez o mais importante para mim, foi aprender a jamais subestimar uma informação de passageiros, seja ela qual for. Passageiro manda um recado que acha que uma asa está caindo? Vamos investigar! Disse que a rota está errada, e o combustível está vazando? Vamos investigar! Afinal, quem avisa, amigo é!



domingo, 21 de fevereiro de 2010

727 e Gnomos

Todo piloto tem sua lista de aviões preferidos. Já disse que o Electra é um deles, além do Boeing 707, que tem uma beleza clássica. Também falei que o mais bonito é o Jumbo 747, e disse que morro de saudades do MD-11. Que o Airbus A-300 é incrível e que o 737 é demais! Pois agora eu digo que o Boeing 727 é um dos aviões comerciais mais belos e fascinante já produzidos.

O 727 é um trijato que foi fabricado pela Boeing entre os anos de 1963 e 1984, sendo que na década de 70, foi o avião comercial mais popular do mundo. Até a década de 90, era o avião mais comercializado do mundo, quando então foi superado pelo Boeing 737. Seu sucesso se deve ao fato de poder operar em pistas curtas, aeroportos com poucos recursos e voar médias distâncias.

A Varig iniciou as operações do 727 em 1970. Um avião lindo, que com seus três motores na cauda tornava-se extremamente silencioso. Me lembro de ter feito algumas viagens na cabine (infelizmente não tive o prazer de pilotar esta máquina) e reparar que durante a partida dos motores só era possível perceber que eles já estavam funcionando pela observação dos instrumentos do motor (rotação, temperatura e pressão de óleo) de tão silencioso que o 727 era. Possuia uma escada que ficava na cauda, assim, era impactante embarcar e desembarcar passando por baixo dos seu 3 motores. Um avião de outra época; tanto é assim, que ao invés dos bagageiros convencionais de hoje em dia, ele possuia apenas porta-chapéus acima dos assentos, exatamente com nos Electras, e por isso, só era permitido colocar casacos e coisas leves neste bagageiro. Outra característica que encantava os pilotos, era a sua velocidade. O “flecha ligeira” (outro apelido do 727, que tinha um enflechamento das asas mais acentuado que as demais aeronaves) era mais veloz que seus concorrentes, só perdia para o Jumbo 747 em sua velocidade de voo. E este encantamento era justamente um inconveniente para os comissários de bordo. Minha mulher, que era comissária da Varig e voou o 727 em 1987, conta que em etapas mais curtas, o tempo de voo ficava reduzido para que a tripulação pudesse efetuar o serviço de bordo com o requinte exigido pela empresa. Naquela época, o serviço era de refeições quentes, com copos de vidro e bebidas alcóolicas. Na Varig o 727 fazia o melhor das rotas nacionais! Voos saindo de São Paulo ou Rio de Janeiro direto para Recife, Belém, Buenos Aires e Santiago do Chile entre outros destinos.

A fuselagem, embora mais curta, era a mesma do Boeing 707, e a cabine de comando também era a mesma do 707. Uma cabine muito ampla e que contava com a presença de um Mecânico de Voo, ou Flight Engineer. Os colegas que tiveram a chance de pilotar o 727 são muito orgulhosos disso, e sempre comentam que o avião tinha uma técnica de pilotagem diferente dos demais Boeings. Uma das características era que ele “descia como um tijolo”, ou seja, na aproximação final para pouso, o 727 aceitava um ângulo de descida muito mais acentuado que as demais aeronaves. Ele descia bem, e os pilotos contam cada estória que até parece papo de pescador. Também havia uma técnica um pouco diferente para o pouso, já que os três motores ficavam na cauda. Instantes antes de tocar a pista, a movimentação do manche e manete de potência davam à mecânica do pouso um estilo peculiar.Era a técnica Kung Fú de pousar. Dá para imaginar...

Com a chegada dos 737-300 (o Chique), o 727 foi cedendo suas rotas mais tradicionais, até que em 1993, ele foi definitivamente transformado em avião cargueiro.

Os Gnomos


O grupo que ficou voando o 727 cargueiro ficou conhecido como os Gnomos, ou Duendes, pois dizia-se que eles existiam, mas ninguém os via! Eles voavam muito nas madrugadas e não usavam os terminais de embarque para acessar os aviões, pois iam direto pelo terminal de carga. Nos hoteis, andavam em 3 (comandante, co-piloto e mecânico de voo), pouco se enturmavam, e como transportavam somente carga, descuidavam um pouco da aparência. Gravata e quepe? Coisa rara de se ver naquele grupo. Tripulantes chegando e saindo nos horários mais estranhos e vestindo jaquetas maneiras? Só podia ser o pessoal do 727. Havia colegas de empresa que estavam voando o cargueiro há anos, mas não os conhecíamos. Ou então encontrávamos um conhecido e perguntávamos aonde ele andava, em que empresa estava trabalhando. – Na Varig, estou voando o 727 cargueiro!
- Voa o 727 cargueiro? Então está explicado!

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

Ai que sono!

Ao assumir programações de voos madrugada a dentro, um dos desafios é se manter acordado e atento. Na fase de voo de cruzeiro, especialmente em etapas de voo longas, o sono aparece, e lutar contra ele é importante.

Quando voei o MD-11 nas rotas internacionais de logo curso, as tripulações eram maiores para que em um determinado momento pudesse haver um revezamento entre os tripulantes para um descanso. Dependendo do tempo total da jornada de trabalho, a tripulação podia ser COMPOSTA ou de REVEZAMENTO. Na composta, voávamos em dois comandantes e um co-piloto e o tempo de voo em cruzeiro era dividido em 3 para que cada um descansasse um pouco. Em um voo para o México ou Nova Iorque, cada piloto tinha entre duas horas e meia a 3 de descanso. Se era de revezamento, trabalhávamos com dois comandantes e dois co-pilotos, e aí o tempo de voo de cruzeiro era dividido ao meio, proporcionando um tempo maior de descanso. Em um voo para Londres, conseguíamos descansar por quase 5 horas seguidas.
Mas nos voos curtos, com tripulações SIMPLES, só há dois pilotos na cabine, então só nos restava ficar acordados, ou no máximo tirar um cochilo.

Cochilar não é a mesma coisa que dormir! Nos voos internacionais, para dormir, tínhamos acomodação horizontal em um compartimento chamado de “crew rest”, também conhecido por “sarcófago”, pois era um compartimento pequeno . Sem dúvida o melhor lugar do avião, melhor que primeira classe! Quando a Varig recebeu os MD-11 que haviam sido da Swissair, os sarcófagos tinham uma configuração ainda mais confortável, e por isso os chamávamos de “chalé Suiço”. Eram similares a 2 tubos de ressonância magnética, porém amplos, com uma pequena entrada equipada com gaveteiros, espelho e uma cortina para cada um dos “tubos-camas”. Este conjunto ficava junto ao teto da cabine, entre a classe econômica e executiva. Um chalé Suiço, pois ficava no alto, com um clima de montanha (cujo frio era aplacado com lençóis e mantas) e um constante barulho de vento vindo do sistema de ar-condicionado.

Já o cochilo, era um pequeno período de descanso na cabine de comando. A Varig não só autorizava, mas também estimulava este tipo de cochilo, chamado “NASA Nap”. Baseado em um estudo da Agência Aeroespacial Norte Americana, que afirma que sob determinadas condições, um cochilo traz benefícios ao alerta situacional e desempenho nas fases de aproximação e pouso. Evidentemente, enquanto um piloto está cochilando,o outro está acordado! O cochilo não deve durar mais que 45 minutos, pois a partir deste tempo o corpo entra em uma fase mais profunda do sono em que a pessoa ao ser despertada, demora um certo tempo para entrar em estado de alerta. Além disso, o piloto ao cochilar deve despertar pelo menos uma hora antes do pouso. Recomenda inclusive o uso de máscara para os olhos e “plug” de ouvidos. Já que é para descansar, descanse para valer! Além disso, mais vale um dormindo e o outro acordado do que dois pilotos semi-acordados, quando um acha que o outro está ligado e no final os dois acabam sem querer cochilando. Isso já aconteceu inúmeras vezes na aviação comercial! Quando o colega diz que vai cochilar, a responsabilidade aumenta, e aí não é tão difícil se manter desperto.

Havia alguns pilotos que simplesmente não conseguiam dormir no avião, nem no sarcófago, e nem na cabine. Era uma sorte trabalhar com alguém assim! Em uma jornada voando na madrugada, o pior momento é a descida, quando estamos nos aproximando do aeroporto. A cabine fica silenciosa, já que os motores estão em marcha lenta, o cansaço tomando conta do corpo, aquelas luzinhas no painel...Não é fácil! Me lembro de uma ocasião, em 1993 aproximadamente, num voo de São Paulo para Manaus com escalas em Cuiabá e Porto Velho. Estávamos chegando em Manaus por volta de 5 horas da manhã, após voar a noite toda. Aquele sono, de olho no instrumento que indicava a distância para a pista. Um silêncio e a distãncia diminuindo: 20 km; 19 km; 18 km...De repente a distancia caiu de 18 para 10 quilômetros! Não sei quanto ao co-piloto, mas eu certamente cochilei por poucos segundos. Num sobresalto, com uma dose de adrenalina, despertei e conduzi normalmente o avião na aproximação. Depois, conversado com o co-piloto, ele disse que estava atento mas que não tinha reparado que por instantes eu havia“apagado”.

Em outra ocasião, desta vez indo para a Europa, já tinhamos deixado São Luiz do Maranhão para trás e seguíamos por uma rota que é pouco usada, e por isso a necessidade de comunicação com os orgãos de controle de tráfego aéreo é menor. Estava com sono e perguntei ao co-piloto como ele estava se sentindo. Como ele disse que estava bem desperto e atento, disse a ele que daria uma cochilada e passei as recomendações: Qualquer coisa me acorde; se der sono acenda a luz da cabine, peça um café ou chame um comissário na cabine para bater um papo. Além disso, se ficar sem graça em me acordar, use o pretexto de ir ao toalete e me acorde. Só não pode dormir também! Lá pelas tantas abri um olho, e vi que ele não parecia estar desperto, muito pelo contrário, parecia já estar de olhos fechados. Me movimentei, liguei as luzes, fiz barulho. E foi na hora certa, pois algumas milhas a frente, havia formações meteorológicas das quais precisamos desviar.

Para lutar contra o sono arrumamos coisas para fazer, e uma delas é planejar a chegada no destino. A cada 30 minutos há um boletim meteorológico atualizado que podemos escutar nas frequências específicas. Outra coisa que espanta o sono é o controle da navegação, anotando e conferindo o desempenho do voo a cada posição ao longo da rota. Longos papos, piadas e casos são contados ao longo da viagem.

É, não é mole, por isso, é fundamental descansar antes dos voos. Café, água no rosto, chimarrão...Vale tudo para não dormir!

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

Patos nos pátios

Recentemente em um vôo para o Rio de Janeiro, já bem próximo da pista, tivemos uma colisão com um urubu. Também pudera, eram tantos urubus voando na área, que seria uma proeza conseguir não trombar com um deles.

Felizmente ele não foi atingido pelos motores, e sim pela fuselagem, e mesmo assim de raspão, deixando apenas algumas penas presas a um dos tubos de pitot do avião. A manutenção efetuou uma limpeza da área afetada, bem como uma verificação da integridade e funcionamento do mesmo antes de seguirmos para Salvador.

Não faz muito tempo, taxiando em Goiânia, havia uma tartaruga caminhando por uma das “taxiways” do aeroporto. Tive que efetuar um pequeno desvio para não passar com os pneus por cima dela, e alertamos à torre de controle que prontamente informou que enviaria uma equipe para remover o animal.
- Sem pressa! Dissemos à torre, pois a tartaruga nos pareceu bastaaaante calma.

Animais nos pátios e pistas é o tipo de ocorrência comum e indesejável nos aeroportos brasileiros, mas outro dia presenciamos uma deliciosa cena. Quem resiste ao charme de um casal de patos passeando com seus filhotes?
-Para tudo! Todas as aeronaves nos pátios, mantenham suas posições, pois a prioridade é dos bichos!

domingo, 7 de fevereiro de 2010

Corra que a chuva está chegando!

Janeiro é sempre um mês de muito calor e chuvas na região sul e sudeste do Brasil. Este fato nunca foi tão verdadeiro quanto neste começo de 2010, sendo que em São Paulo tivemos o janeiro mais chuvoso já registrado. Foram vários dias em que tanto o aeroporto de Guarulhos como de Congonhas estiveram fechados para pousos e decolagens em função da chuva forte. O pior horário é a tarde, mas também houve neste mês tempestades no período da noite e madrugada.

No final de janeiro tive uma programação para decolar de Guarulhos para Porto Alegre por volta das 4 horas da tarde. Bem no horário previsto para a tempestade. Saí de casa com uma antecedência maior, já de olho no céu, observando as nuvens crescendo e prometendo mais um dia de caos na Paulicéia Desvairada.

Alguém já disse que a única parte realmente perigosa da aviação é o trajeto de casa para o aeroporto e vice-versa. Uma grande verdade! Com os vidros fechados e ar-condicionado ligado, afinal a temperatura já marcava 33 graus, segui meu caminho. O percurso foi tranqüilo, com o trânsito habitual na Marginal Tietê, e um motoqueiro que passou batendo no retrovisor, sem maiores prejuízos.

Em Guarulhos, já com os passageiros embarcados, fomos para a cabeceira da pista em preparativos para a decolagem. Tanto pelas imagens do radar meteorológico quanto pelo visual, podíamos observar que sobre a cidade de São Paulo, e portanto, sobre o aeroporto de Congonhas, a chuva já caia forte. Assim, abandonamos a trajetória do procedimento de subida que nos havia sido autorizado, e efetuamos um longo desvio contornando a cidade e os CB’s. Lá de baixo, a cena não devia ser animadora, mas de cima bem que estava bonito de ver.

Até Porto Alegre o vôo foi tranqüilo, com poucos desvios e nenhuma turbulência. Na descida, já nos preparamos para um possível mau tempo. A temperatura na área da pista de pouso de POA já marcava 39 graus, e estando a pressão atmosférica bem abaixo da normal, sabíamos que em breve a cidade estaria de baixo de uma tempestade.

Encontramos algumas nuvens de chuva no segmento de descida, um pouco de turbulência moderada, e seguimos nos aproximando do aeroporto. Para a performance do avião, o ideal é uma condição de baixa temperatura e alta pressão, pois assim, com o ar mais denso, o desempenho do motor é melhor. Além disso, a própria pilotagem fica mais fácil com o ar menos rarefeito. Mas as condições eram justamente opostas, e na aproximação final o avião sacolejava, lutando contra o vento forte que vinha pela esquerda e levemente de cauda. Normalmente pousamos e decolamos com vento de frente, sendo que o vento de cauda é permitido dentro de certos limites. O fabricante impõe um valor, e a empresa aérea ou aceita, ou reduz ainda mais o limite de componente de cauda permitido nos pousos e decolagens.

Tira a potência, acelera novamente, olho no velocímetro, cuidado para não perder o alinhamento com a pista! Atenção para o vento de cauda! Está com apenas 4 nós de velocidade, dentro do limite permitido. Firme na razão de descida, cuidado para não ficar nem alto nem baixo! Algumas milhas à frente, além do aeroporto, uma nuvem negra se aproxima, vamos pousar logo antes que “caia o mundo” em Porto Alegre!

Nestas condições, não se espera um pouso macio, apenas um pouso firme e seguro. Mas é incrível que como a adrenalina é alta, frequentemente conseguimos pousos excelentes nestas condições.

Ao tocar com as rodas na pista, uma surpresa: Um dos reversores não está atuando! Por três segundos ou menos, fiquei “brigando” com a manete, tentando movê-la para a posição de reverso. Então vem um comando interno do cérebro que me diz para deixar de lado a manete que não está atuando e usar o reverso restante. Freios aplicados, um reversor somente e em seguida já estamos livrando a pista em velocidade baixa.

Neste caso, se o reverso não atuou foi porque o sistema que monitora e detecta possíveis falhas ou anormalidades do reversor, percebeu algo e por segurança manteve o comando bloqueado. Na verdade, nos cálculos de performance de frenagem, o reverso não é computado, é apenas um benefício a mais. Informamos o ocorrido à manutenção, que em pouco menos de 30 minutos efetuou as verificações e procedimentos para a normalização do reversor.

De Porto Alegre o vôo seguia para Brasília, e queríamos decolar no horário previsto, pois a tal da nuvem negra se aproximava. Decolamos, deixando para trás a tempestade que não tardou a chegar sobre o aeroporto. Cinco minutos após nossa saída a torre informa que o aeroporto estava fechado devido à chuva forte!

Até Brasília o vôo foi fácil, com alguns desvios sobre a região de Bauru, no interior de São Paulo. A 60 quilômetros além do aeroporto de Brasília, nuvens pesadas e cheias de raios e atividade iluminavam o horizonte. Elas estavam longe, e tivemos uma chegada fácil na Capital Federal. No regresso a São Paulo, as nuvens que tanto transtorno causaram ao paulistano naquela tarde já tinham se dissipado, e as 23:40 hs, pousamos tranquilamente em Guarulhos.

Agora só falta a parte perigosa da aviação: Voltar para casa de carro! Será que ainda há pontos de alagamentos na cidade? Congestionamentos e semáforos queimados? Árvores caídas, crateras nos asfalto e ruas interditadas? Respirei fundo e segui em frente.

sábado, 6 de fevereiro de 2010

O Professor de Balé

Durante um voo, a comissária veio na cabine e me informou que um passageiro queria falar comigo. O passageiro havia se identificado dizendo ter sido meu professor de balé nos anos 80.

Eu disse a ela que aquilo deveria ser uma brincadeira de algum amigo que por coincidência estava no vôo, ou então um grande engano onde o suposto professor de balé estava me confundindo com outra pessoa. De qualquer forma, visitas não são permitidas, então que dissesse a ele que seria um prazer recebê-lo na cabine após o pouso. A comissária disse que iria transmitir o recado, mas disse que havia uma terceira possibilidade. A de que ele realmente era meu ex-professor de balé, e eu estava com vergonha de admitir.

No desembarque, qual não foi a minha satisfação em encontrar o Crivellaro, que aguardou todos passageiros desembarcarem para me cumprimentar.

Ele havia sido Comandante na Varig, e eu fui seu co-piloto nos anos 86/87 quando voamos o Electra na Ponte Aérea. Lembro-me de um vôo de avaliação que fizemos juntos, quando ele, além de avaliar meus conhecimentos e pilotagem, ainda me ensinou algumas coisas naquelas 4 etapas RJ/SP. Este é o tipo de vôo de avaliação legal, quando além de mostrar o que você sabe, ainda tem a chance de aprender.

O Cmt. Crivellaro foi instrutor e checador em todos equipamentos em que voou na Varig, além de ter ocupado cargos junto à Diretoria de Operações. Um excelente piloto e muito querido por todos. Quando em 2003 eu fui voar o MD-11, ele já estava no Boeing-777. Com a crise da Varig, muitos pilotos foram voar no exterior, principalmente na Europa, Oriente Médio e Ásia. Alguns esperaram a “velha” Varig encerrar as operações para seguir a carreira lá fora, outros saíram antes disso. O Cmt. Crivellaro atualmente voa em uma grande empresa na Ásia.

Ele contou que a vida lá não é fácil, mas que está bem adaptado e feliz voando o B-777 para o mundo todo. Contou que a empresa é boa de se trabalhar, e que é incrível a falta de flexibilidade dos asiáticos. Para exemplificar, ele comentou um caso em que ainda durante o embarque, percebeu-se que o sistema de vídeo de um passageiro sentado na classe executiva não estava funcionando. Solução simples, pensou ele! Se a classe executiva não está lotada, e há vários assentos disponíveis, basta que o passageiro mude de assento. Mas não, não é assim que eles fazem por lá. O passageiro fica onde está e o vídeo deve ser consertado. Para isso, o pessoal da manutenção embarca com os devidos equipamentos e ferramentas e conserta o vídeo, ainda que isso represente um atraso no vôo!

Contou também que após o período de instrução, ele foi submetido ao vôo de avaliação por um comandante da empresa. Ele já havia voado na aviação internacional por muitos anos na Varig, e também já possuía experiência no B-777, portanto foi só uma questão de se adaptar à rotina operacional daquela empresa.

Neste voo de cheque, durante o “joint-briefing”, com toda a tripulação reunida antes mesmo de seguiram para o avião, ele fez os comentários de rotina a respeito do vôo. Sempre observado pelo comandante checador, falou sobre os procedimentos a serem adotados em caso de encontrarem turbulência durante a viagem. Comentou que conforme o procedimento da empresa, caso ele ligasse o luminoso de “apertar os cintos” (com apenas um aviso sonoro, ou seja, um “chime”, que é aquele “plim” que se ouve quando o luminoso é aceso) o aviso valeria somente para os passageiros, mas que se o luminoso fosse ligado duas vezes (uma logo após a outra, com dois “chimes” seguidos), então além dos passageiros, toda a tripulação de cabine também deveria permanecer sentada.

O vôo transcorreu sem problemas, sendo que em determinado momento em que eles iam enfrentar uma turbulência moderada, o Cmt. Crivellaro efetuou o tal procedimento, ligando o luminoso duas vezes seguidas para que todos se sentassem. Após o desembarque no destino final, o Crivellaro e o comandante checador se reuniram em uma salinha para o “de-briefing” e o veredicto sobre o vôo de avaliação. O checador parecia aflito, levando constantemente as mãos à cabeça, e disse que o vôo havia sido bom, mas que ele, Crivellaro, havia cometido um erro gravíssimo, e não sabia o que fazer! Disse que havia um procedimento especial com relação ao luminoso de apertar os cintos, em que em caso de turbulência moderada, além de ligar duas vezes o luminoso de atar os cintos, ele deveria ter feito um anúncio pelo sistema de som, confirmando a todos os passageiros e tripulantes da necessidade de retornar aos assentos. Que situação! Mas ele foi aprovado, tendo prometido que jamais repetiria aquele "grave" erro.

Na semana seguinte, já aprovado e voando para Nova Iorque, ele percebeu que iriam passar por uma área com turbulência moderada, e além de ligar o luminoso por 2 vezes seguidas, também efetuou o anúncio aos passageiros. Horas depois, ao encontrar novas áreas de turbulência, o procedimento foi repetido. Foi então que o co-piloto olhou para ele com cara de quem não está entendendo, e perguntou qual era o motivo dele fazer tantos anúncios aos passageiros ao entrar em turbulência. Ele contou o caso, dizendo inclusive que havia sido repreendido no vôo de avaliação! Pois não é que o co-piloto disse que aquele procedimento era meramente usado em voos de cheques, quando em avaliação para mostrar serviço, e que ninguém usava este procedimento??? Coisas da aviação.

Quanto às aulas de balé? Nada contra, mas não, eu nunca dancei balé em minha vida.

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

Vacas Sagradas, Cupins de Piano e Crupiês na aviação

Para os pilotos, a melhor parte é decolar e pousar, por isso procuramos dividir as etapas do voo. Cabe ao Comandante determinar a “divisão das etapas”, sendo que a maioria dos colegas tenta ser justa nesta tarefa.

Se o vôo é de duas etapas, na primeira um dos pilotos será o PF (pilot flying) e vai decolar, pilotar, pedir os checklists e finalmente pousar o avião no destino enquanto o outro piloto fica de assessor, ou PNF (pilot not flying) sendo responsável pela comunicação pelo rádio, preenchimento de navegação, leitura de checklist e outras tarefas. Na etapa seguinte inverte-se os papeis de PF e PNF.

Nos vôos internacionais de longo curso, as tripulações são maiores, com 2 comandantes e 2 co-pilotos, é a chamada tripulação de revezamento. Durante os preparativos para saída, todos os 4 estão na cabine trabalhando, pois há sempre o que fazer. A verificação e ajustes dos instrumentos, inserção e verificação da rota nos equipamentos de navegação é feita pela dupla ocupando os assentos de pilotagem. A outra dupla também tem o que fazer, sendo que a mais importante é a verificação dos manuais contendo as cartas de aproximação e pouso.

São muitas cartas para se verificar, pois além das cartas de origem, destino e alternativa, devem estar a bordo as cartas dos possíveis aeroportos ao longo da rota. De São Paulo para Frankfurt, pode haver a necessidade de um pouso não programado na Ilha do Sal, em Casablanca, Tenerife, Lisboa, Madri, Zurich, etc. Algumas localidades, Paris, por exemplo, possui quase 64 cartas, e se faltar apenas uma, pela Lei de Murphy, é bem provável que será justamente a mais necessária na chegada. Ok, há um setor na empresa que é responsável pela atualização destes manuais, mas tudo tem que ser verificado mais uma vez.

Além disso, há a inspeção externa, quando damos uma volta ao redor do avião checando se está tudo nos conformes. Tubos de pitot, pneus e conjuntos de freios, motores e aspecto geral da aeronave deve ser verificado com olhos atentos. E o mais importante de tudo: Verificar se há lençóis e travesseiros em número suficiente para as camas de descanso dos pilotos!

Quando atingimos o nível de cruzeiro, uma dupla descansa até metade do vôo enquanto 2 ficam trabalhando na cabine. Na metade do caminho, que fica próximo à Ilha do Sal em um vôo típico para a Europa, quem estava descansando volta para a cabine para ocupar o posto de pilotagem, cedendo a cama (conhecida como “sarcófago”) a quem estava trabalhando. Pouco antes de iniciar a descida, os 4 pilotos devem estar ocupando seus assentos, atentos às instruções do controle de tráfego aéreo até que se estacione a aeronave para o desembarque dos passageiros.

Ao regressar ao Brasil, o ideal é que todos os pilotos tenham feito pelo menos uma operação de pouso ou decolagem na função de pilot flying, pois como eu disse, o gostoso é pilotar!

Mas esta divisão justa das etapas nem sempre foi assim. Até o ano de 1990, antes da chegada do conceito de CRM, os co-pilotos da aviação internacional tinham pouca chance de “por as mãos no manche”.

O CRM

Na origem, significava Cockpit Resource Management, e foi trazido para o Brasil pela Varig a partir do acidente com o 737 que caiu na Amazônia em 1989. O CRM, que com o passar dos anos se tornou mais abrangente, tendo o significado das iniciais se alterado, preconizava um melhor diálogo entre os tripulantes, na busca de informações que levassem ao aprimoramento das decisões na cabine de comando. A idéia era que a hierarquia e a diferença de experiência entre pilotos não se tornasse uma barreira na comunicação. Um co-piloto com pouca experiência em determinado avião ou rota, poderia ser a “chave” para que o Comandante, cheio de experiência e conhecimento, tomasse a decisão correta.

Antes do uso do conceito de CRM, certos Comandantes da aviação internacional, com muitos anos de experiência, os “Vacas-Sagradas”, não distribuíam bem as etapas. Talvez por não confiarem na capacidade de seus jovens co-pilotos, não os permitiam operar o avião nas decolagens e pousos.

Somente em vôo de cruzeiro é que os co-pilotos podiam sentar no assento da direita para novamente ceder aos Comandantes nas operações de aproximação e pouso. Sentados nos Jump-Seats (assentos extras na cabine, logo atrás dos postos de pilotagem), ficavam separando e entregando aos Comandantes cartas dos procedimentos de chegada. Cartas de descida, aproximação, cartas de pouso, de taxi e de estacionamento nos pátios!

Assim, estes co-pilotos, que podiam passar meses sem pousar ou decolar o avião, ganharam alguns apelidos:
Papagaio de Aerovia, pois o que mais faziam durante o vôo era a fonia, ou seja, a comunicação via rádio com os órgãos de controle de tráfego aéreo.
Cupim de Piano, pois estavam na melhor “madeira” (o Jumbo), comiam da melhor madeira (serviço de bordo era tudo de bom!), ouviam da melhor música (rotas para Paris, Nova Iorque, Frankfurt, Tókio e etc.) mas não tocavam nada, já que pilotar que era bom não era com eles.
E finalmente, eram também chamados de Crupiê, pois não participavam da jogada, ficavam apenas distribuindo as cartas aos jogadores!