
O regulamento diz que o piloto não pode
beber nas oito horas que antecedem o trabalho. As empresas recomendam doze e até dezoito horas de abstinência alcóolica
antes do voo. O regulamento também diz que ninguém poderá exercer qualquer
função a bordo sob efeito de drogas ou álcool. No entanto, ao contrário da
atual Lei Seca para motoristas, ainda não há no Brasil uma quantidade álcool no
sangue que possa ser considerada um limite máximo. Teoricamente, um piloto que
bebeu 3 caipirinhas entre meio dia e duas da tarde, pode assumir um voo as dez
da noite para voar a madrugada toda. Estará ele em boas condições? Se ele deu
uma dormida à tarde, acho que sim, caso contrário, provavelmente terá
dificuldade para encarar a jornada.
Uma lata de cerveja no jantar às sete
da noite, parece não ser um problema para um voo as duas da manhã (sete horas
depois) se o piloto conseguir dormir um pouco antes de assumir o voo. O problema
é que as pessoas são diferentes, tanto na maneira de pensar como na maneira que
o organismo reage ao álcool. Há os que não bebem uma gota de álcool no dia em
que vão voar, mesmo que este voo seja à noite, e há os que não se importam e
beber no almoço e voar no final da tarde.
Com relação às drogas, o problema é
similar. Aposto minhas divisas que deve haver pilotos que, em algum momento
antes do voo, consomem drogas ilícitas. E se deve acontecer com pilotos,
certamente também ocorre entre os comissários(as). Não é incomum sentir cheiros
suspeitos nos corredores dos hotéis de pernoite. Há ainda outras drogas que podem
alterar a capacidade de raciocínio, tais como estimulantes.
Em 1984 eu tinha um professor de inglês
que era piloto e fora afastado do voo devido ao alcoolismo. Nestes anos de
aviação comercial, sabíamos de colegas que tinham sérios problemas com a
bebida. Quase sempre estas pessoas são muito queridas e capazes, exímios
pilotos, com uma pilotagem acima da média. Certa vez houve um colega que, ao se
apresentar para o voo em Belém, teria dado sinais de que estava de ressaca, ou
talvez até embriagado. A tripulação de comissários se recusou a efetuar o voo e
um grande problema surgiu. Como o comandante já tinha tido problemas de outra
natureza com a chefia de pilotos, ele acabou sendo demitido. Foi em 1990, nada
ficou provado.
Em uma empresa estrangeira, dois pilotos
tomavam alegremente sua cerveja num pub. Flertando com duas mulheres,
conversa vem, conversa vai e eles
comentaram que eram pilotos e que voariam na manhã seguinte. Foram denunciados
e horas depois, na apresentação para o voo, foram submetidos ao teste do
bafômetro. Foram demitidos.

Hoje em dia, um piloto como o representado
pelo Denzel Washington não duraria muito numa empresa de aviação comercial. No
nosso dia a dia, temos que interagir com muitas pessoas e um piloto sob efeito
de drogas ou álcool, teria que ser muito hábil para não deixar transparecer sua
condição. No passado, alguém percebendo ou suspeitando que um piloto estivesse
sob efeito de álcool, teria receio de denunciar ou se recusar a fazer parte
daquela tripulação. Hoje é diferente, e a maioria dos tripulantes não hesitaria
em denunciar e se negar a voar com um piloto que aparentemente não estivesse
bem.
As empresas de aviação no Brasil estão
cientes do problema e estão criando programas para detectar e evitar que
tripulantes possam trabalhar sob o efeito de drogas e álcool. Elas temem o que
possam encontrar ao submeter seus tripulantes a exames específicos e
aleatórios. Além do custo que pode ocorrer, já que a princípio, um tripulante
que for considerado um alcóolatra não pode ser demitido, deve ser submetido a
um tratamento. Algumas empresas submetem seus funcionários ao “teste do cabelo”
onde uma amostra do cabelo (ou unha, ou qualquer outro pelo do corpo) é enviada
para análises específicas que detectam a presença de uma série de substâncias
que podem estar presentes até semanas após o uso.
No final da “velha Varig”, no surgimento da
“nova Varig” (antes desta ser adquirida pela GOL), nós pilotos, fizemos este
exame. Alguns poucos colegas não quiseram se submeter a este teste e ficaram de
fora da nova empresa, outros, cerca de 3% do total que foram examinados, foram
reprovados.
Eu passei, sou “ficha limpa”, e agora se me
dão licença, fico por aqui e vou pegar uma cervejinha na geladeira.