Meu voo, de
Brasília para Viracopos/Campinas, decolou às sete e quinze da noite conforme o
previsto e ao atingir o nível de cruzeiro visualizamos diversas nuvens pesadas
à frente. Um desvio para lá, outro para
cá e deixamos Uberaba para trás. Entrando no estado de São Paulo, ainda
desviando das nuvens pesadas, iniciamos a descida cientes das condições
meteorológicas de Congonhas, Guarulhos e Viracopos. Guarulhos, que estivera
fechado para pousos e decolagens por aproximadamente 25 minutos, estava aberto
e o controle de tráfego aéreo retomava o sequenciamento das aeronaves que até
então estavam em espera. Neste momento Congonhas teve suas operações suspensas
por estar debaixo de chuva forte e os aviões que para lá se destinavam
iniciavam espera. Viracopos estava aberto, porém com chuva leve sobre a pista.
Nestas horas
o controlador de tráfego aéreo tem que ser bom! Os pilotos que estão em voos de
espera ficam pressionando por estimativas de melhora e abertura dos aeroportos;
até parece que não sabem que o controlador, que está dentro de uma sala
fechada, não tem como prever quanto tempo vai levar para a chuva passar. Quem
determina se o campo está aberto para pousos é a torre de controle, que no caso
de Congonhas, ainda depende da administradora do aeroporto para fazer uma
vistoria na pista antes de liberá-la. Os pilotos, de olho na quantidade de
combustível a bordo, analisam suas alternativas primárias e secundárias já que
nem sempre podem seguir para determinado aeroporto devido à lotação de pátios
para estacionamento e outras dificuldades inerentes à infraestrutura
aeroportuária brasileira.
Próximos a Viracopos, vendo nitidamente pela
tela do radar meteorológico que a cidade de campinas estava debaixo de um CB
(nuvens de chuva forte), fomos orientados a voar em círculos, pois nosso
destino estava fechado para pousos. Com bastante combustível de reserva e para
não congestionar a frequência rádio desnecdesnecessariamente,
iniciamos nossa espera informando aos passageiros a nossa situação. O vento era
forte e aparentemente estava empurrando para longe do aeroporto as nuvens
pesadas. Nosso aeroporto de alternativa era Confins/Belo Horizonte cujo tempo
permanecia bom, a frente fria ainda não havia chegado por lá. Além de Confins
ainda poderíamos contar com Guarulhos e Galeão, o que nos deixava bastante
tranquilos.
Não foi
necessário nem quinze minutos de espera e Viracopos abriu, a chuva ainda estava
sobre o campo, mas agora com fraca intensidade. Orientados pelo controle de
tráfego aéreo, entramos na sequência para pouso recebendo uma informação que
para mim foi inédita: havia bastante quantidade de granizo sobre a pista de
pouso! À nossa frente seguiam duas outras aeronaves,
o que era bom, pois assim os pilotos ao pousarem poderiam passar alguma
informação relevante caso encontrassem alguma dificuldade no pouso, além do
mais, dois aviões pousando antes de nós, certamente dissipariam parte do
granizo.
Na
aproximação final, com chuva nos para-brisas, não demorou para avistarmos a
pista, o vento já não era forte e estava praticamente alinhado com a nossa
trajetória. Na área de toque dos pneus com a pista quase não havia mais
granizo, porém, à medida que a velocidade diminuía, não apenas víamos uma
grande quantidade deles sobre a pista, mas também sentíamos o avião rolando
sobre pedras de gelo.
Em 30 anos
de aviação, esta foi uma situação inédita para mim. Já pousei debaixo de chuva
forte, debaixo de neve, ventos laterais, de cauda, com raios e rajadas, mas em
uma pista parcialmente coberta de granizos (ice-pellets, ou ainda, hail, em inglês), foi a
primeira vez!
Caramba Comandante... Granizo sobre a pista deve ser crítico. Existe algum procedimento para essa situação além de atenção redobrada? abços
ResponderExcluirNossa granizo, não é uma situação para arremetida e alternar, digo; e seguro pousar nestas condições?
ResponderExcluirAbraço comando, bela postagem, eu imagino a ansiedade de livrar a pista com segurança!!!
Caro Padu e Carlos, não há um procedimento específico para pousar sobre pedras de gelo. naquela ocasião o controle nos perguntou se iríamos aguardar ou prosseguíamos para o pouso. Como à nossa frente havia dois aviões, optamos por prosseguir, pois os aviões à nossa frente seriam os "bois de piranha" que se encontrassem alguma dificuldade de frenagem, ou outra situação anormal, certamente reportariam. Dois aviões decolando e um decolando já foram suficiente para "limpar" a área de toque e início de frenagem. Por outro lado não haveria problema algum em arremeter ou ou aguardar mais um tempo para a dissipação das pedras de gelo. Em tempo, o pouso e a frenagem foram absolutamente normais. Um abraço, Roberto..
ResponderExcluirBoa comando
ResponderExcluirBois de piranha kkkk
Estes dias conversando com meu professor de aviônicos, que trabalha na Trip perguntei como se fazia os teste depois da manutenção, e ele me disse que eles pegam o primeiro piloto que bobear na frente e fazem o voo de teste com ele,
ele até narrou historias ilarias de falhas durante os voos de teste. principalmente com a ilustre participação de novatos da manutenção...
Mas uma duvida me ocorreu, como isso funcionava na VARIG e como funciona na GOL, existe um piloto de teste ou se tem a mesma ideia da Trip,
Caso seja igual, vai um gancho pra mais uma historia.
Afinal, em teste nem tudo funciona como deveria.
Grato e até a próxima
Caro Carlos, não há um piloto de testes nas empresas, porém para efetuar um voo destes, as empresas costumam escalar um comandante que seja instrutor, ou ainda ter alguma outra exigência. E num caso de maior urgência pode até acontecer da empresa escalar o primeiro que bobear pela frente. Infelizmente eu não tive a sorte de efetuar um voo destes, mas vou conversar com alguns colegas e fazer uma postagem a este respeito. Valeu pela dica! Roberto.
ExcluirComandante,mais um post muito bom como sempre,continue contando esses casos do mundo aeronáutico simplesmente fantásticos,o senhor tem muito talento com a escrita também,e o livro?,como anda?,quero garantir meu exemplar!
ResponderExcluirCaro Anônimo, o projeto do livro continua, mas eu ando meio relaxado, ocupado, sei lá. Preciso me dedicar a isso, obrigado pelo incentivo.
ExcluirRealmente aviação tem umas facetas desafiadoras,que mesmo se tomando todos os cuidados ainda pode restar margem para problemas!!
ResponderExcluirCreio que aterrissar em uma pista coberta por granizo deve realmente fazer a adrenalina subir mesmo se sabendo que outros o fizeram antes,é aquela estoria,um vai se da bem,o outro idem,mas vai que a bruxa está com agente e aí..!
Parabens Comandante pela pericia e tambem por nos trazer mais este lado do mundo da aviação,eu pensava que gelo só incomodava em voo,e sei até de alguns acidentes causados por seu acumulo nas superficies das aeronaves,agora no solo ainda não tinha visto nenhum comentario!!