Na aviação, assim como na vida, conhecemos pessoas incríveis. Em 95, eu era instrutor no
Boeing 737-200 e tive o privilégio de receber o Santos Júnior como aluno num programa de instrução que durava em média dois meses e meio. Já o conhecia, pois em 1986 quando eu era
co-piloto de Electra na Ponte Aérea, ele era mecânico de voo também no Electra. Pessoa simples, muito inteligente, esforçado e parceiro para qualquer passeio. Enquanto voava como mecânico de voo, tirou o
brevet de piloto e naquela ocasião iniciava o
treinamento para a função de
co-piloto. Antes da aviação comercial ele voava na
FAB no transporte de autoridades, quando nos aviões, além dos pilotos, ia a bordo um mecânico dando o suporte aos pilotos quando necessário. Contava
ótimas estórias. Contou que por volta de 1984, fazendo uma escala em
Florianópolis numa noite fria e chuvosa, surgiu um problema no avião em que enquanto os pilotos passeavam no aeroporto ele se esforçava para resolver, tendo que relevar o frio e a chuva. À bordo, a esposa do Presidente da República. Ele resolveu o problema, consertou o avião, sendo que a certa altura, molhado e com frio e a Primeira Dama vendo a situação daquele Sargento de 20 e poucos anos, resolveu ajudar dando a ele uma meia de lã para ele vestir, já que ele estava ensopado. Quando pilotos chegaram e viram aquela situação, quase que deram ordem de prisão a ele, e mais tarde a Primeira Dama teve que interceder a seu favor, explicando a situação. Aliás antes dele se formar na escola de sargentos em
Guaratinguetá, uma das
atividades era um salto de
paraquedas. Um salto "automático" onde nem é necessário puxar a
cordinha, pois a mesma é fixada no interior da cabine do avião. Para o salto, os aspirantes a Sargentos ficavam enfileirados e ao comando do oficial superior se atiravam pela porta. Os que relutavam em saltar recebiam um chute no traseiro, então ele achou por bem ir "na boa". Acontece que ao abrir o
paraquedas, uma das cordas enroscou por cima do pano, e ele vinha caindo rapidamente e rodopiando. Imediatamente se lembrou das instruções para neste caso, soltar o principal e abrir o auxiliar. - Nem pensar que eu vou soltar o principal, se nem este funciona, como confiar no para-quedas auxiliar? O aspirante a Sargento, num estilo
Mc Gyver, foi puxando uma corda daqui, uma
dalí e pouco antes de chegar ao chão, o para-quedas estabilizou e ele pousou suavemente. No período que voamos juntos ele me contou muitas
estórias, e tentou me convencer a decorar o código Morse, que ele sabia de
cór. Mais tarde, voando com um comandante que era tinha fama de ser chato, seu conhecimento do código Morse criou uma
estória engraçada. Ao se aproximar de Campo Grande, o Santos Júnior sintonizou no rádio-navegação do avião a estação de Campo Grande, e ouvindo o código Morse que esta estação emite, ele a identificou
corretamente, e anunciou: -Rádio estação Campo Grande sintonizada e identificada! Pois o Comandante, que não viu ele
checar na carta de navegação os "pontos e traços"
correspondentes àquela estação e não sabendo que ele sabia de
cór, foi logo falando: -Não é só ouvir o "
di-
di-
di, dá-dá-dá" tem que verificar na carta! E a resposta veio logo:-Pois eu sei o código
morse de
cór, e já está
corretamente identificado, respondeu com segurança o "
escoteiro/
radionavegador". O comandante, incrédulo, rapidamente o testou se ele sabia mesmo e engoliu em seco dando razão a ele. Outra
estória foi também com este comandante, e na verdade, antes do episódio anterior. Durante o procedimento de partida dos motores, ele começa a fazer
perguntinhas ao Santos Júnior, testando o conhecimento do
co-piloto. Perguntas do tipo: qual é a temperatura máxima permitida para os motores, ou qual a pressão de óleo durante a partida? Santos Júnior, que não tinha nada de bobo, perguntou se ele por acaso ele exercia a função de comandante examinador, e se aquele era um voo de exame para ele. -Não, não sou examinador, respondeu o comandante. Santos
Jr. então perguntou se ele estava perguntando pois queria testar conhecimento, ou se era porque ele mesmo não sabia e estava com vergonha de dizer. -É só um "bate-bola". -disse o comandante, já estranhando a
relutãncia do copiloto em responder. Foi então que Santos
Jr. propôs: Então vamos fazer o seguinte, eu escrevo num
papelzinho os valores e você escreve também, depois nós comparamos para ver as respostas. Era muito esperto esse Santos Júnior! Um grande colega, um grande coração.
Não tem uma foto do Santos Jr.?
ResponderExcluirAcredite, não tem. Vou pedir a ele uma foto.
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