sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

Uma marca difícil de ser superada

Não conseguir pousar no aeroporto de destino e seguir para a alternativa é algo que acontece com pouca frequência no dia a dia de um piloto comercial. Em 2010 “alternei” apenas duas vezes, uma quando Porto Alegre estava fechado para pouso devido à chuva forte, e a outra quando em Uberlândia as nuvens estavam tão baixas que não foi possível encontrar condições visuais para o pouso.

A quantidade de combustível que os aviões carregam é sempre calculada de forma que não seja transportado querosene a mais, portanto desnecessário ao voo. Quando um avião decola com o combustível mínimo para um voo, há neste total, além do necessário para voar da origem ao destino, bastante combustível a mais. Há um extra para o caso do consumo na etapa ser maior que o previsto em função de ventos desfavoráveis e não previstos, ou mesmo para o caso de desvios em rota que tornam a viagem mais longa. Há também o combustível necessário para, após uma arremetida ao não conseguir o pouso no destino, seguir para o aeroporto de alternativa. E finalmente, no cálculo do combustível mínimo, está incluído um adicional de 30 minutos de voo para eventuais esperas. Além do combustível mínimo para o voo, a critério da empresa ou do comandante, pode-se acrescentar um adicional quando conveniente. Uma previsão de mau tempo ou acúmulo de tráfego aéreo são as causas mais comuns para se voar com mais combustível. Assim, temos sempre uma reserva para espera antes que tenhamos que decidir por voar para o aeroporto de alternativa.

Mesmo com uma quantidade generosa de querosene nos tanques, houve uma ocasião em que alternei três vezes no mesmo dia, um “feito” que dificilmente vou repetir!

Foi no trecho SP/BH voando o B 737-300. Decolamos para o aeroporto da Pampulha e no regresso a Congonhas não foi possível efetuar a aproximação, pois os valores de “teto e visibilidade” estavam de tal maneira que somente os aviões equipados com receptores de GPS poderiam seguir no procedimento por instrumentos. Naquela época a “velha Varig” enfrentava dificuldades e poucos eram os aviões da frota que dispunham de GPS. Diante disso, após alguns minutos de espera e não havendo previsão de melhora em Congonhas, seguimos para o pouso em Guarulhos.

Após um tempo em solo e com novos passageiros embarcados, seguimos para mais uma etapa com destino a Belo Horizonte, desta vez para o aeroporto de Confins. Na volta de Confins para Congonhas o tempo já havia melhorado em São Paulo, mas devido ao acúmulo de tráfego aéreo do final de tarde tivemos que fazer uma espera. Em seguida, com a mudanças na direção do vento, o controle de tráfego aéreo estava coordenando uma “mudança de pista”. Ao inverter o sentido de pousos e decolagens em uma pista, já que estas operações devem ser feitas contra o vento predominante, há uma certa demora e as aeronaves em aproximação são solicitadas a efetuar espera. Nosso combustível de reserva não era muito, e após mais 20 minutos de espera com uma previsão de uma demora ainda maior, novamente tivemos que seguir para Guarulhos. Desembarcamos 130 passageiros descontentes, já que muitos teriam que enfrentar o trânsito terrível do final da tarde.

Nossa programação naquele momento passou a ser um voo de translado, ou seja, levar o avião sem passageiros para Congonhas. Após abastecer com muito mais que o mínimo de combustível, e com a confirmação de que Congonhas estava aberto para pousos, decolamos com apenas a tripulação a bordo. E não é que poucos minutos após a decolagem os valores de teto e visibilidade em Congonhas voltaram a cair? Novamente as aproximações só poderiam ser feitas por aqueles que dispunham de GPS a bordo! Congonhas não melhoraria tão cedo, então após uma breve espera sobrevoando a cidade de Santos, mantendo contato com a empresa,  regressamos a Guarulhos.

Fiquei  frustrado por não ter conseguido pousar no aeroporto de destino naquele dia. Logo eu, que adoro Congonhas? Fui para casa um pouco decepcionado e acrescentei ao meu currículo uma marca difícil de ser superada: três alternados no mesmo dia!

16 comentários:

  1. E não demore tanto a voltar a postar! "Alternei" 15 dias aqui no seu blog!
    Abraços!

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  2. É Cmte Tem dia que a noite e fogo. Isso passa.

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  3. eita que isso mexe com a escala da tripulação inteira, bagunça tudo, só o mal tempo para causar tantos transtornos a tripulação e aos pax!! em agosto pretendo começar meu curso de comissário de bordo, gol é meu sonho de consumo!!

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  4. É..!
    Tudo pela segurança aérea.
    E ainda tem gente que tem medo de voar...Aff!

    Bom post comando, e não nos deixe muito tempo sem eles, já estamos viciados!

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  5. Comandante, os aviões da Varig que não dispunham de GPS, voavam por inercial ou somente rádio-navegação? No caso de inercial, quantas plataformas inerciais tinha o 737-300?

    Obrigado por mais um belo relato.

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  6. Escreva mais Comandante, adoro suas histórias.

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  7. Comandante Beto, já voei em diversas companhias e algumas poucas vezes os pilotos arremeteram durante a aproximação. Em todas as arremetidas, os pilotos sempre apresentavam uma justificativa plausível para terem arremetido, como mudança na direção do vento, aeronave anterior não livrou a pista a tempo, não foi possível avistar a pista durante o procedimento, enfim.

    E quando se chega desestabilizado na aproximação, por erro de pilotagem mesmo, pelo cansaço por exemplo, chegou muito alto, numa pista sem ILS e sem PAPI, como na Pampulha, que justificativa o senhor daria aos passageiros? Ou não faria speech nenhum?

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  8. Final de dezembro e janeiro é complicado. Acabo priorizando os passeios com os filhos em função das férias escolares, então sobra menos tempo para o Blog.

    Clint Walker, não duvido que em breve a gente esteja voando junto.

    Mariel Fonseca, os 737-300 possuem dois inerciais, que utilizam sinais de rádio (VOR, DME etc) para fazer up-dates de posição. Na velha Varig, eram poucos os que dispunham de GPS. Nos 7327s que possuem GPS, que é o caso nos NGs, esta atualização é constante.

    Jorge Sampaio, ultimamente com o conceito de "aproximação estabilizada", e como hj em dia não dá para fazer "peladas" tem sido comum arremetidas por não estarmos dentro dos parâmetros da aproximação estabilizada. Nas dua últimas vezes que isto ocorreu, informei aos PAX, mais ou menos o seguinte: - Prezados passageiros, tivemos que descontinuar a aproximação para o pouso pois julguei que não estávamos perfeitamente estabilizados na aproximação final. Na aproximação devemos estar na tampa certa, na velocidade certa e com a potência certa, e como um destes parâmetros não estavam como eu gosto, preferi efetuar uma arremetida e reiniciar a aproximação para que ela fique perfeita.

    Simples assim. Depois do pouso enquanto taxiamos para o estacionamento, eu dou mais uma explicação, ressaltando que a opção pela arremetida é sem dúvida a mais correta, e todos desembarcam tranquilos.

    É isso, um abraço a todos, Roberto.

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  9. Olá, conheci seu blog a pouco tempo, fazendo sei lá o que... Mas gostei tanto que em algumas horas na frente do computador eu li todos os posts...
    Para começar gostaria de saber o que o sr. pensa a respeito da proposta da ANAC sobre a Tripulação Múltipla, eu sinceramente não consigo ver o lado ruim da coisa (embora eu veja comentários contras), pois para mim chegar a 1000mil horas de vôo eu demoraria muito tempo, pois devido a características da minha vida, eu não tenho como ir voar agrícola por exemplo, ou viver em uma aerocuble, trabalhando de "graça" se desse para poder fazer as horas. Eu faria isso, não como já disse, tem coisas que me impedem...

    abraço, e como disse o companheiro acima, não demore tanto a postar...

    []

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  10. Grande Carvalhinho,


    Não querendo diminuir a sua "proeza" de ter arremetido três vezes no mesmo dia, gostaria de saber qual foi a contribuição da infraestrutura aeronáutica para essa sua marca praticamente imbatível.

    Quando você menciona que "novamente as aproximações só poderiam ser feitas por aqueles que dispunham de GPS a bordo", isso sugere que o ILS em Congonhas estava inoperante.

    Ora, mesmo com toda a acurácia do sistema, os procedimentos GPS são considerados como sendo de "não precisão" e os seus requisitos mínimos de teto e visibilidade são consideravelmente maiores que os requeridos em uma aproximação ILS.

    Portanto, dadas as características de Congonhas, a inoperância do ILS certamente causa enormes transtornos para os usuários e prejuízos para as empresas que, afinal, pagam elevadas tarifas de "auxílio à navegação" para usufruir de um serviço que nem sempre lhes é prestado.

    Quem sabe se a Infraero fosse responsabilizada civilmente pelos transtornos e prejuízos causados pela sua ineficiência não teríamos uma melhor prestação desse serviço? Nesse caso, a sua marca seria mesmo imbatível...

    Um grande abraço,


    Moraes

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  11. Caro Moraes, esta estória aconteceu no início de 2007, ainda na Varig do "chinês". A pista era a 35 de Congonhas e ainda não tinha ILS, ou se tinha, ele estava inoperante. Foi um fiasco, pois enquanto TAM e GOL pousavam, a frota da "Varig do Chinês", que naquela época era redusidíssima, tinha que alternar. É isso, lembranças aos colegas que estão voando com vc.

    Abç, Carvalho

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  12. Comandante, descobri seu blog a cerca de 1 mês e já consegui ler todos os posts, pra mim é a melhor publicação sobre a aviação comercial que já li. Revela para nós, o que ocorre nos bastidores da aviação e com certeza me ajudou a ter ainda mais confiança na segurança da aviação. Parabéns.

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  13. Comandante, o senhor almeja voar uma aeronave mais moderna, como o A320 ou até mesmo partir para a internacional, voando A330 ou Boeing 777-300ER na TAM? O senhor não acha o 737 um tanto ultrapassado não, visto que não possui alguns recursos que os Airbus possuem, como auto-trimm, fly-by-wire e etc?

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  14. Pedro eu gostaria de abrir um parentes na sua colocação, voar Boeing é maravilhoso haja visto que a boeing é conservadora em alguns aspectos como mantiveram até hoje manche, os 800 ainda tem algumas peculiaridades dos duzentinhos, sou piloto virutal e comparando airbus com boeing eu prefiro muito mais pilotar um 800 da vida do que um a320, mais do que possa ter de parafernalias computadorizadas, como dizem os amigos da golVirtual, um verdadeiro notebook voador, não menospresando porque o a320 é um excelente aviao, agora rodar um 800 na decolagem e ouvir aquele barulhinho de trimagem no ouvido não tem preço rsrsrsrs

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  15. Caro Alessandre, nao li profundamente sobre o projeto da ANAC, mas pelo que entendi, acho que a ideia pode ser boa. Talvez 50 horas de treinamento em simulador de voo tenha mais qualidde na formacao de um piloto do que 150 horas de Paulistinha ou simular em voos visuais. È claro que nao se pod dispensar o bom e velho voo visual pois ele vai aprimorar o pe mao, seja ele fito no Paulistinha, no planador ou na aviacao agricila. Acho que a proposta pode ser poisitiva sim.

    Caro Pedro Paulo, Gostaria sim de voar o Jumbo 747, de preferencia o 800, assim como um dia eu ja desejei pilotar o Concorde. Mas para isso nao vou abrir mao da minha vida no Brasil para voar na Singapura, Emirates, ou Korean Airlines. Tambem nao vou sair d uma empresa para entrar em outra (TAM) para talvez em 8 anos estar voando na Internacional, ate porque, eu ja voei na aviaco internacional na Velha Varig. Aquilo sim era uma aviacao boa! Ja trabalhei na maior e melhor empresa aerea do Brsil, e nao hoje nao tenho necessidade e nem vontade de voar na maior, mas nao necssariamente melhor empresa aerea brasileira, a TAM. Claro que nao devo descartar nenhuma possibilidade, mas estou bem onde estou. Gosto da lina Boeing. Ja voei Lockheed (Electra); Embraer (bandeirante), Boeing (737 3 767), Airbus (A 300) e Douglas (MD 11). Todos eles fantasticos avioes, e no quesito conforto e modernidade, ate acho que a linha Boeing perde, mas no quesito da pilotagem, maleabilidade, flexibilidade, facilidade e ate confiabilidade, nao ha nada como os avioes da Boeing. Asim como o Ederson (comentario acima), nao simpatizo com a linha fly by wire da Airbus, mas se um dia tiver que voar um deles, ok.

    E isso, um abraco, Roberto
    PS. Estou em Bogota, e neste tclado do PC do hotel, nao consigo acentuar as palavras!

    Segunda feira colocarei uma nova postagem.

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  16. Roberto, uma vez o cmte Printz (aquele do seu voo para disney, se nao me engano) nos convidou a passar a noite na cabine do 747 da varig de gru a frankfurt, foi fantastico! Parabens pelo blog!

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