Na virada para o ano 2.000 as dificuldades da Varig eram muitas. As projeções de crescimento para aquele ano não aconteceram e nos anos seguintes, novos acontecimentos no cenário mundial agravaram a situação da empresa. O 11 de setembro e a gripe aviária na Asia (SARS), foram sérios entraves paras as rotas internacionais, fazendo com que a Varig cancelasse os voos para alguns destinos, inclusive nas rotas nacionais. Voos para tradicionais da Varig, tais como Campo Grande, Cuiabá, Marabá e outras cidades estavam sendo deixados para a concorrência. Dizia-se que estas rotas já não eram lucrativas, e além disso, a frota estava lentamente diminuindo. Me lembro que nesta época, em um trecho da Ponte Aérea, viajou na cabine um colega, comandante da empresa e fortemente ligado ao Sindicato dos Aeronautas. Ele passou o voo todo falando da gravidade da situação, mostrando que várias rotas estavam sendo canceladas, aviões sendo devolvidos às empresas de leasing, e até aviões parados por falta de peças para a manutenção. Ele dizia que se nada fosse feito, não demoraria muito e a Varig iria parar. Mais uma vez não pude acreditar naquele cenário tão tenebroso, achava que era impossível uma empresa tão grande e importante como a Varig, encerrar as atividades.
O tempo foi passando e as "profecias" daquele colega foram acontecendo. O primeiro semestre de 2006 (o último da "velha" Varig) foi terrível! Os funcionários estava sem receber o décimo terceiro salário, o plano de previdência privada, o AERUS, não estava pagando corretamente aos aposentados, os salários estavam sendo pagos com atraso, em parcelas e quem tirasse férias naquele semestre não recebia os valores correspondentes. Mesmo assim os funcionários continuavam a trabalhar, empenhados em "tocar a aviação para a frente". No início de 2006, os modernos Boeings 777 pararam de voar e assim, a frota de MD-11 e Boeing 767 eram insuficientes para cobrir toda a malha de voos internacionais. Logo pela manhã, já se previa que um ou dois voos seriam cancelados no período da noite. O pessoal do despacho e check-in tinham um trabalho enorme para acomodar os passageiros dos voos cancelados, sendo que aqueles que não pudessem embarcar em outras empresas, tinham que ser acomodados em hoteis para tentar viajar no dia seguinte, causando um inevitável efeito cascata. À bordo, a tripulação tinha que se virar para contornar a falta de recursos materiais que, naqueles tempos, estavam bastante limitados. Muitos dos artigos que normalmente embarcavam com sobra para os passageiros, agora estavam faltando. Os comissários, já sabendo das dificuldades que iriam encontrar durante as viagens, traziam de suas próprias casas, café, açucar e até papel higiênico para suprir o toalete do avião. Poltronas que não reclinavam, sistemas de vídeo e banheiros inoperantes desafiavam a tolerância dos passageiros e também a paciência da tripulação. A pouca disponibilidade de crédito da empresa tinha que ser canalizada para combustível, óleo e outros ítens indispensáveis ao voo e, com isso, os pilotos tinham que ser muito cuidadosos no gerenciamento do pré-voo. As palavras que mais ouvíamos naquele primeiro semestre de 2006 eram "contingências e flexibilização".
Licenças não remuneradas e plano de demissão voluntária foram incentivados pela direção da empresa. Diariamente os jornais e a televisão davam notícias da crise da Varig, com imagens de passageiros em enormes filas tentando embarcar em seus voos. Muitos pilotos, não acreditando em uma solução, sairam para voar em outras empresas, seja no exterior ou aqui no Brasil, mas a maioria, ainda que a procura de um outro emprego, continuava a voar na Varig. Em 28 de julho, com apenas um avião da Varig voando (um 737 da Ponte Aérea), pois os demais estavam no pátio aguardando uma solução, houve o leilão da Varig, tal como preconizava o Plano de Recuperação Judicial.
Os nervos estavam à flôr da pele, uma nova Varig estava para surgir! Ninguém sabia como seria, mas uma coisa era certa: Não haveria emprego para todos. O dia seguinte ao leilão, ficou conhecido por "Tsunami", tamanha foi a devastação causada a tantos funcionários. Liderado pelo Lap Chan, um sino-brasileiro, a "nova" Varig tentava retomar os voos com apenas cerca de 20% dos seus antigos funcionários. Ao mesmo tempo em que me senti contente por ter sido incluido nesta nova empresa, fiquei chateado pelos inúmeros colegas que não mereciam ter ficado de fora. Nos meses, com o imediato aporte de recursos financeiros, as coisas foram melhorando. Os salários foram pagos integralmente e algumas aeronaves estavam voltando a voar. Muitas promessas e novas esperanças surgiram, mas a verdade é que no começo de 2007, novamente o alarme estava soando! O grupo que havia comprado a Varig, não parecia realmente disposto a continuar injetando dinheiro na empresa, e rumores surgiram de que haveria uma nova venda, ainda que parcial, para um outro grupo. No final de março de 2007 foi anunciado que a nova "Varig" possuia um novo dono, a Gol, que tentou retomar as linhas internacionais, mas um ano depois, diante das dificuldades enfrentadas, anunciou o encerramento das linhas internacionais de longo curso, passando a voar a marca Varig nas linhas nacionais e América do Sul.
Da velha Varig só restou a lembrança de uma grande empresa, que foi chamada de Pioneira e reconhecida no Brasil e no mundo pelo alto padrão de qualidade de seus serviços, mas que infelizmente sucumbiu às dificuldades encontradas. Eu tive o privilégio de trabalhar na velha Varig por 22 anos e, sei que ainda que no presente eu tenha um bom emprego, aquela aviação ficou no passado, só restando as boas recordações.
Realmente muito triste, no momento em que a Gol comprou a Varig o senhor já passou a ser automaticamente um fucionário do grupo, ou houve uma burocracia nessa triste mudança?
ResponderExcluirAbração
Comandante, o que levou uma empresa tão grande, onde não lhe faltavam clientes, quebrar? Má gestão ou dificuldade de adptação aos novos tempos, a nova forma de fazer aviação?
ResponderExcluirParabéns pelo blog.
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirTriste e muito ver uma empresa que até hoje apesar , dessa situação é a marca brasileira mais lembrada no exterior, mais ainda para nós que pretendemos um dia ser aviadores , ver gigantes como a Varig,Panam e tanta outras quebrarem, e com essas novas empresas com as chamada "soluções de mercado" acabando com o glamour de voar.
ResponderExcluirRoberto eu sei que é algo bem pessoal o ambiente de trabalho , mas muito se escuta falar em um ambiente de terror na Gol da diretoria com os funcionarios da empresa , isso tem algum fundo de verdade ou não?(responda se quiser,ou no me email caso queira mais privacidade pnogueira1991@yahoo.com.br,se não responder entendo seu lado como profissional.)
Parabéns pelo blog!
E tudo de bom bons voos!
Caros seguidores, a tranferência foi tranquila. É claro alguns se sentiram diminuidos, outros quiseram realmente diminuir o pessoal remanescente da Varig, mas nada que não seja esperado em fusões e aquisições. O que fez a Varig acabar? Uma conjunção de fatores, entre eles, dificuldades econômicas, fatores políticos (PT?), má administração, desvio de recursos, vaidade de alguns, enfim, coisas do mundo capitalista. O ambiente na Gol é bom, trabalha-se tranquilo, desde que se faça o que está previsto, o que não é difícil. É claro que em qualquer ambiente de trabalho há alguns aspectos difíceis, que fazem parte da vida coorporativa. No passado (período do Barioni) realmente havia uma política operacional com um certo "terror" à aqueles que por ventura cometessem um erro de operação durante os voos, mas já a algum tempo que a política mudou. Não dê ouvidos, ou pelo menos , não acredite em tudo que falam por aí.
ResponderExcluirAbçs, Roberto.
Parabéns pela fidelidade a empresa comandante, eu acredito na velha Varig como um patrimônio nacional ela não poderia ter acabado assim, espero um dia ver a varig em grande numero nos céus do brasil e do exterior novamente.
ResponderExcluirCmte. se eu for escrever aqui o solavanco que me abateu quando vi a foto aérea do pátio da VEM, tirada pelo Gianfranco Betting e que ilustrou a derrubada da pioneira, T7, 767, 757, 737s, 727 da Vlog, MD11 todos amontoados e inertes, sem um ruído dos motores, foi para mim tão ou mais impactante do que o segundo avião se chocando com a 2a Torre do World Trade Center.
ResponderExcluirO que parecia estória fictícia entrou para a história da aviação, virou realidade, mas uma realidade indigesta similar a um filme de terror, um caos total. A pioneira, embaixada de asas do Brasil havia sido abatida.
Difícil tentar crer no que a imprensa alardeava, cresci vendo e sonhando ser piloto da "Rosa-dos-ventos", nenhuma outra cia nos aeroportos me despertava tanto a atenção como a pioneira. Pensava que um dia poderia mostrar aos meus filhos esta paixão avassaladora que me dominou desde a primeira viagem, aos 6 anos de idade, quando pela primeira vez conheci Congonhas, e viajei à Recife ida e volta em um boeing 737-200.
As vezes me conformo em ter vivido esta época gloriosa da VARIG, mas também da aviação brasileira. Sinto-me orgulhoso por ter tido o privilégio de ter viajado em ícones da aviação mundial e que compunham a frota da VARIG-CRUZEIRO-NORDESTE-RIO-SUL na minha época, 727-100,737-200,300,500,757,766-200/300,DC-10,A300,MD-11 e sempre alimentando o sonho de voar no JUMBO, mas tinha que ser da VARIG.
Confesso que a aviação sem a Varig nunca mais foi a mesma para mim, até hoje em inúmeros voos que fiz na Gol curiosamengte nunca voei em nenhum dos boeings com as cores da "Nova Varig".
Meu último voo na "velha Varig" foi uma despedida com estilo, depois de mais de 30 anos de dedicação e adoração à VARIG o primeiro jump da minha vida de entusiasta PREMIADO pela adoração fidelizada à aviação e à VARIG, e assim voei no boeing 737-300 de matrícula PP-VNY.
Esta despedida da "Rosa-dos-Ventos" foi e será insequecível, talvez uma premiação de "Icaro" a mim, fiel escudeiro da Pioneira.
Sentimento saudosista por relembrar que os passageiros eram tratados como pessoas e não como número em estatística de rentabilidade operacional.
Além disso, minha mente continuará projetando a imagem daqueles pilotos que permitiam as visitas a cabine durante os voos, quando perguntava á eles "vocês sabem mexer em todos esses "reloginhos"? E afirmativamente me respondiam com aquela cordialidade que me parecia ser requisito obrigatório a contratação de todos os funcionários da pioneira.
Simuladores próprios, catering, centro de manutenções e lojas espalhadas ao redor do mundo, esta era a varig e será a varig que levarei comigo.
Cmte., me desculpe por ocupar muitas linhas do seu blog com este meu post, mas o fiz de coração aberto e em homenagem a todos aqueles que fizeram a VARIG ser o que ela foi e será lembrada pelas gerações que conviveram com o brilho da "estrela" brasileira.
Jose Brito
Foz do Iguaçu-PR
Snif snif snif. :'( mas que post mais triste. Haja coração!!!!
ResponderExcluirPor muito tempo ouvi o CCO da Varig,era um movimento imenso,como era em ondas curtas conseguia ouvir até mesmo os voos internacionais,escutava sempre em 11.366 kHz.
ResponderExcluirCheguei a ouvir algumas confidências das tripulações nesta frequencia,perguntando ao pessoal de terra por esta e aquela situação e de como agir com a falta de recursos a bordo.
Depois o trafego da frequencia foi diminuindo e morrendo aos poucos,gostava de ouvir o Daniel passando os reportes,metar e até resultado de jogo de futebol.
Uma pena o fim da Varig!!
Roberto muito obrigado por me responder ,
ResponderExcluirfico lisonjeado,e muito bom saber de quem
vive a situação rotineiramente .
O senhor chegou a voar com o Cmte. Ivan Saldanha no MD-11? E com o Ênio Dexheimer?
ResponderExcluirComandante, acho que voei com o senhor hoje 25/05, GLO1780 GRU-SSA, eu ia pedir jump mas a Chefe De Cabine disse que não seriam permitidas visitas durante a preparação...
ResponderExcluirCaro Paulo Moscato, não voei com o Dexheimer, mas evidentemente conheço ele. Um ótimo piloto e conhecido por todos da "velha" Varig. Já o Ivan Saldanha, não o conheci.
ResponderExcluirCaro "anônimo", vc é rápido mesmo! O voo foi tranquilo, né?
Abç, Roberto
Pois é, Comandante, agora só nos resta chorar.. Ou, quem sabe, avaliar.
ResponderExcluirSituação provocada por valores complexos. Erros de uma parte, interesses de outras. Mas a nossa história não poderia passar por isso. Mágoas, manchas, interesses, erros, consequências e etc.
Foi, e é, lamentável. Ruim não apenas para nós apaixonados pela Varig ou para nós gaúchos. Péssimo para o Brasil. Péssimo para a aviação...
Sem entrar em méritos, todos acabamos perdedores. E, se alguém se achou "privilegiado" com o episódio, foi ou é mutio pequeno...
Um abraço.
Eu me confundi, não é Ivan Saldanha e sim Ivan Leopoldo. Era conhecido por comandante "Tainha". Ele até aparece num DVD da VarigLog, voando também MD-11.
ResponderExcluirPaulo Moscato, é claro que conheço o Ivan Leopoldo! Uma pessoa queridíssima de todos. Não tive o prazer de fazer parte da tripulação dele, mas já viajei na cabine quando ele era o cmt do voo, mais de uma vez. Abç, Roberto.
ResponderExcluirCarvalho,
ResponderExcluirme permita só uma retificação:
você não voou na "Velha Varig", você voou na Pioneira, na Única VARIG.
saudações
Meus amigos, em primeiro lugar gostaria de dar os PARABÉNS ao nosso querido Cmte Beto Carvalho, o qual tenho grande admiração, pelo belo, interessante e útil blog. No meu ponto de vista, nem quem tinha grande interesse e fez grande pressão para o fim da VARIG saiu ganhando, pois a dívida dela é quase o dobro da VARIG, coisa perto de 10bilhões, ou seja, mesmo com o sumiço da VARIG ela não conseguiu se erguer.
ResponderExcluirPolitics, nothing more than political ... clueless.
Grande abraço.
Prezado comandante.
ResponderExcluirHoje tenho 52 anos, e me lembro que com 7 meses de vida, juntamente com meu pais, fizemos uma viagem a França, e a cada 2 anos íamos visitar a família que lá se encontra, talvez não seja de seu tempo, mais me lembro do famoso Electra com aquela simpática saleta nos fundos do avião, como era charmoso sentar-se naquelas poltronas confortáveis, e depois os famosos Boeing 707 que levavam cerca de 22 a 23 horas de viagem total ate o destino, serviços de bordo de primeira qualidade onde tinha como guardanapos de linho branco com o logo da VARIG, quanta saudades, sinto uma profunda tristeza no coração quedo releio depoimentos e histórias a respeito desta companhia que alguns nem sabem o significado das 4 letras, VARIG significa VIAÇÃO AÉREA RIO GRANDENCE, e como era grande, com seus aviões de cor inconfundíveis, com aquela enorme estrela na calda que era respeitada em todo o mundo, prezado comandante, muito obrigado pelo blog, e receba meu forte abraço, pois sei que mesmo em outra companhia aérea, o senhor carrega no coração a quela estrela linda, muitas felicidades ao senhor, obrigado.
Que mensagem linda e triste.
ResponderExcluirFui e ainda sou fan e sobrinho adotivo da Varig. Meu primeiro voo foi o PP-VLG que era um boeing 727. Foi lindo demais aquele momento. Eu era uma crianca que depois da falencia dos meus pais como fazendeiros do Nordeste, decidi vender picole na praia de Pajucara em Maceio para poder pelo menos enganar ao meu coracao que ainda tinha algumas moedas no bolso.
Consegui juntar em CR$1,499.00 e comprei a minha primeira passagem nos trechos: MCZ-REC. Era o voo RG 342, procedente de Porto Alegre e escalas Sao-Rio-Ssa-Aju-Mcz e Recife. Consegui ficar abordo entre Mcz-Rec.
Aquele dia acontecia uma festa em meu coracao. Foi naquela estrela que eu estava abordo e subi pela trazeira onde ali entrando me sintia como um rei e pisando nas escadas de um castelo. Foi lindo demais aquele momento onde eu viajava como menor desacompanhado e carregava comigo a emocao de ter conquistado o meu sonho.
Que saudade da Varig. Me sinto um sobrinho adotivo da mesma por nunca ter tido nenhum parente trabalhando por ela mas me sentia parte da familia. Luciano Buarque(Hoje em Londres)