Ao assumir programações de voos madrugada a dentro, um dos desafios é se manter acordado e atento. Na fase de voo de cruzeiro, especialmente em etapas de voo longas, o sono aparece, e lutar contra ele é importante.
Quando voei o MD-11 nas rotas internacionais de logo curso, as tripulações eram maiores para que em um determinado momento pudesse haver um revezamento entre os tripulantes para um descanso. Dependendo do tempo total da jornada de trabalho, a tripulação podia ser COMPOSTA ou de REVEZAMENTO. Na composta, voávamos em dois comandantes e um co-piloto e o tempo de voo em cruzeiro era dividido em 3 para que cada um descansasse um pouco. Em um voo para o México ou Nova Iorque, cada piloto tinha entre duas horas e meia a 3 de descanso. Se era de revezamento, trabalhávamos com dois comandantes e dois co-pilotos, e aí o tempo de voo de cruzeiro era dividido ao meio, proporcionando um tempo maior de descanso. Em um voo para Londres, conseguíamos descansar por quase 5 horas seguidas.
Mas nos voos curtos, com tripulações SIMPLES, só há dois pilotos na cabine, então só nos restava ficar acordados, ou no máximo tirar um cochilo.
Cochilar não é a mesma coisa que dormir! Nos voos internacionais, para dormir, tínhamos acomodação horizontal em um compartimento chamado de “crew rest”, também conhecido por “sarcófago”, pois era um compartimento pequeno . Sem dúvida o melhor lugar do avião, melhor que primeira classe! Quando a Varig recebeu os MD-11 que haviam sido da Swissair, os sarcófagos tinham uma configuração ainda mais confortável, e por isso os chamávamos de “chalé Suiço”. Eram similares a 2 tubos de ressonância magnética, porém amplos, com uma pequena entrada equipada com gaveteiros, espelho e uma cortina para cada um dos “tubos-camas”. Este conjunto ficava junto ao teto da cabine, entre a classe econômica e executiva. Um chalé Suiço, pois ficava no alto, com um clima de montanha (cujo frio era aplacado com lençóis e mantas) e um constante barulho de vento vindo do sistema de ar-condicionado.
Já o cochilo, era um pequeno período de descanso na cabine de comando. A Varig não só autorizava, mas também estimulava este tipo de cochilo, chamado “NASA Nap”. Baseado em um estudo da Agência Aeroespacial Norte Americana, que afirma que sob determinadas condições, um cochilo traz benefícios ao alerta situacional e desempenho nas fases de aproximação e pouso. Evidentemente, enquanto um piloto está cochilando,o outro está acordado! O cochilo não deve durar mais que 45 minutos, pois a partir deste tempo o corpo entra em uma fase mais profunda do sono em que a pessoa ao ser despertada, demora um certo tempo para entrar em estado de alerta. Além disso, o piloto ao cochilar deve despertar pelo menos uma hora antes do pouso. Recomenda inclusive o uso de máscara para os olhos e “plug” de ouvidos. Já que é para descansar, descanse para valer! Além disso, mais vale um dormindo e o outro acordado do que dois pilotos semi-acordados, quando um acha que o outro está ligado e no final os dois acabam sem querer cochilando. Isso já aconteceu inúmeras vezes na aviação comercial! Quando o colega diz que vai cochilar, a responsabilidade aumenta, e aí não é tão difícil se manter desperto.
Havia alguns pilotos que simplesmente não conseguiam dormir no avião, nem no sarcófago, e nem na cabine. Era uma sorte trabalhar com alguém assim! Em uma jornada voando na madrugada, o pior momento é a descida, quando estamos nos aproximando do aeroporto. A cabine fica silenciosa, já que os motores estão em marcha lenta, o cansaço tomando conta do corpo, aquelas luzinhas no painel...Não é fácil! Me lembro de uma ocasião, em 1993 aproximadamente, num voo de São Paulo para Manaus com escalas em Cuiabá e Porto Velho. Estávamos chegando em Manaus por volta de 5 horas da manhã, após voar a noite toda. Aquele sono, de olho no instrumento que indicava a distância para a pista. Um silêncio e a distãncia diminuindo: 20 km; 19 km; 18 km...De repente a distancia caiu de 18 para 10 quilômetros! Não sei quanto ao co-piloto, mas eu certamente cochilei por poucos segundos. Num sobresalto, com uma dose de adrenalina, despertei e conduzi normalmente o avião na aproximação. Depois, conversado com o co-piloto, ele disse que estava atento mas que não tinha reparado que por instantes eu havia“apagado”.
Em outra ocasião, desta vez indo para a Europa, já tinhamos deixado São Luiz do Maranhão para trás e seguíamos por uma rota que é pouco usada, e por isso a necessidade de comunicação com os orgãos de controle de tráfego aéreo é menor. Estava com sono e perguntei ao co-piloto como ele estava se sentindo. Como ele disse que estava bem desperto e atento, disse a ele que daria uma cochilada e passei as recomendações: Qualquer coisa me acorde; se der sono acenda a luz da cabine, peça um café ou chame um comissário na cabine para bater um papo. Além disso, se ficar sem graça em me acordar, use o pretexto de ir ao toalete e me acorde. Só não pode dormir também! Lá pelas tantas abri um olho, e vi que ele não parecia estar desperto, muito pelo contrário, parecia já estar de olhos fechados. Me movimentei, liguei as luzes, fiz barulho. E foi na hora certa, pois algumas milhas a frente, havia formações meteorológicas das quais precisamos desviar.
Para lutar contra o sono arrumamos coisas para fazer, e uma delas é planejar a chegada no destino. A cada 30 minutos há um boletim meteorológico atualizado que podemos escutar nas frequências específicas. Outra coisa que espanta o sono é o controle da navegação, anotando e conferindo o desempenho do voo a cada posição ao longo da rota. Longos papos, piadas e casos são contados ao longo da viagem.
É, não é mole, por isso, é fundamental descansar antes dos voos. Café, água no rosto, chimarrão...Vale tudo para não dormir!
História: O dia que um bombardeiro B-25 colidiu com o Empire State
Building, na cidade de Nova Iorque
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*Ative a legenda em português nas configurações do vídeo*
Em 28 de julho de 1945, o bombardeiro *North American B-25D-20 Mitchell*,
número de cauda *41-30...
Há 5 horas
Caro Comandante
ResponderExcluirVc teria fotos deste crew rest?
E outra pergunta
Como vcs fazem pra entrar nele? Rola tipo uma "camuflagem" da tripulação pra ninguem ver?
Imagina aqueles com medo de aviao vendo o piloto indo dormir e nao tendo a mínima idéia que na cabine tem um substituto! hehehe
Caro Alê, infelizmente eu não tirei fotos do sarcófago do MD-11. Sabe aquela coisa de ir deixando para o próximo voo? Pois é, quando ví, já não tinha próximo voo. Havia um sarcófago que ficava na entrada do avião, na porta dianteira. Ao entrar no avião, ao lado esquerdo da porta, havia uma espécie de armário que após a decolagem, ao passar 10.000 pés de altitude, este "armário" era aberto e extendido, de transformando no sarcófago com duas camas. Quando armado, o sarcófago ficava impedindo o acesso à porta dianteira do avião. Geralmente o comandante ficava na cama de cima, e o copiloto na de baixo. Como este sarcófago ficava junto à galley, bem próximo da cabine, dificilmente o passageiro nos via. Já no modelo "chalé Suiço", era comum o passageiro ver a gente saindo de lá com uma cara de sono. As vezes antes de sairmos, interfonávamos para os comissários e pedíamos para eles fecharem uma cortininha que separava a saída do sarcófago da cabine dos passageiros. Bons tempos, dá saudade daquele "trabalho", quando estávamos no período de descanso, ganhando $ enquanto outros colegas estavam na cabine de comando. Abç Roberto.
ResponderExcluirValeu Comantande! Tirou uma curiosidade minha. O que o senhor acha do Boeing 727? Ele é o meu favorito. Dizem que o 727 é o 4x4 da aviação. Sustenta tudo. É uma aeronave boa de pilotar? Grande abraço, Arcoverde
ResponderExcluirCaro Comandante... como é gostoso ler histórias assim... é realmente incrível saber que pessoas tão importantes para mim, como todo e qualquer piloto, são, são... iguais a mim... rsrs!
ResponderExcluirSem dúvida, me espelho em vc para minha futura carreira de piloto...
Eu havia te dito anteriormente sobre meu "sonho de ares", que eu queria seguir carreira militar, na EPCAr e posteriormente, AFA. Contudo, tive um pequeno [grande] problema em meu joelho, creio que para este ano, não conseguirei estar, humanamente, a 100% do meu condicionamento físico, imprescindível para ingressar num órgão militar como este. Estou no 3º ano do Ensino Médio, este ano é ano de decisão para mim... se eu não puder realmente ingressar na AFA, na tua opinião, fazer um curso superior de Engenharia da Aviação num ITA ou UFSCAR me seria útil para a carreira de piloto civil? Sei como está o mercado atual, no quesito empregabilidade, é certeza que sairei empregado. O Brasil perde 60 e só forma 17 engenheiros aeronáuticos... empregado, e ganhando bem como um engenheiro ganha, poderia pagar sossegadamente meus cursos como PP, PC, PLA, etc., o senhor acha este caminho uma escolha sábia? Do ponto de vista profissional aplicado à carreira de piloto, ter no "curriculum" Engenharia da Aviação contribuiria para minha carreira de piloto?
Muito grato pela resposta, no aguardo e sempre te seguindo,
Danilo.
Comandante gostei muito do post,mas acho que se fosse um tripulante seria destes que não dormem durante o voo,gostaria de ficar atento a navegação e aos instrumentos.
ResponderExcluirVou contar um pequeno caso que ilustra esta paixão: Certa vez aqui em minha cidade houve a demonstração de um helicoptero da Unimed e eles estavam realizando alguns voos com as pessoas,como cheguei já no final, e por conhecer algumas pessoas responsaveis pelo evento dei sorte e eles me deixaram seguir com eles para a cidade vizinha onde iriam realizar outra demosntração,chegamos nesta cidade na hora do almoço, e o piloto disse que teria que conseguir alguem para ficar tomando conta do helicoptero,me ofereci de pronto para ficar de guarda.
Fiquei com fome mais satisfeito por poder ficar na aeronave!!
Paixão é paixão!!!
Olá Danilo, é difícil dizer a vc o que fazer, mas em todo o caso, aqui vai a minha opinião: Cursar o ITA, sem dúvida será bom para sua carreira de ENGENHEIRO. Você certamente terá a garantia de um bom emprego. No entanto, este diploma não será útil para a carreira de piloto, a menos que no futuro vc consiga um emprego na própria Embraer, na função de pilotos de provas, embora neste caso eu acredito que a Embraer vai preferir vc como engenheiro do que como piloto. A faculdade de Ciências Aeronautica pode ser uma boa opção, pois é um curso mais fácil que ITA, e eventualmente alguma empresa/empregador pode dar preferência para pilotos com diploma nesta área. Mas o fato é que até onde eu sei as empresas aéreas que exigem ou que dão preferência a pilotos que possuem diploma de curso superior, não fazem questão que seja de Ciências Aeronáuticas, pode ser qualquer curso superior. Algumas empresas podem exigir um mínimo de horas de voo (digamos 500, 1000 horas de voo), porém se o candidato tiver curso sup. este nº de hora de voo pode ser diminuido. A Azul, na admição para co-pilotos, tem dado preferência a candidatos jovens, com um bom nível de inglês e sem exigir muitas horas de voo. Por último, lembre-se que o que importa no curriculum de um piloto, não é aonde ele concluiu o 2º grau ou se tem diploma de curso superior, o que impoorta é a sua experiência, quantas horas de voo, quais aviões voou. Espero não estar deixando vc ainda mais confuso. Abç, Roberto
ResponderExcluirQue isso Roberto... vc tá me deixando com mais certeza do meu futuro, rsrs! Você teria algum outro contato, um e-mail, ou algo do gênero para podermos conversar de maneira mais direta? Obrigado, Danilo.
ResponderExcluirCaro Roberto,
ResponderExcluirestou na mesma situação do Danilo... Estou no terceiro ano, ano de decisão e pretendo partir para a área de piloto civil...
No entanto tenho algumas dúvidas...
No momento pretendo fazer o curso de aviação civil na Anhembi Morumbi, que creio que seja a mesma coisa que ciências aeronáuticas. Pelo que ví, ao final do curso, o aluno sai PC com 150 horas (+ o adicional que pode-se fazer em aeroclubes). Você acha que essa seja uma boa decisão?
Outra coisa que me intriga é a questão do CCF (inclusive li um post mais antigo que vc falou da renovação de CCF): tenho uma miopia relativamente alta (8 graus em um olho e 6,5 em outro), no entanto é só isso que tenho de problema (pressão, retina, tudo certo!). Você acredita que esse possa ser um empecilho na expedição de CCF?
Pra finalizar, gostaria de parabenizá-lo pelo blog e pelas histórias aqui contadas!
Abraços,
Rodrigo Domingues
Danilo, me passe seu e-mail.
ResponderExcluirRodrigo, quanto a sua miopia, eu acho que não é obstáculo, mas quem tem que dizer é o laudo do exame médico da aeronáutica. Lembre-se que no Brasil há vários pilotos que possuem a visão em apenas um olho. Quanto ao curso na Anhembi-Morumbi, pode ser uma boa opção. Abç Roberto.
Roberto,
ResponderExcluirtambém gostaria de manter um contato de forma mais direta com você, se possível.
Meu email é:
rodrigondomingues@ymail.com
Muito obrigado,
Abraços!
Opa Roberto, segue aí meu e-mail/msn:
ResponderExcluirdan.filho69@hotmail.com
Forte abraço, aguardo teu contato para trocarmos idéias!
otimo post!
ResponderExcluirpara qm quer ter uma ideia de como é o crew rest:
http://www.airliners.net/photo/0496127/L/
http://www.airliners.net/photo/1008034/L/
http://www.airliners.net/photo/0908517/L/