quarta-feira, 28 de outubro de 2009

De magrela para o trabalho

Dizem que a parte mais perigosa numa viagem de avião é o trajeto de casa para o aeroporto. Acho que é verdade, sendo que aqui em São Paulo, é também uma das partes mais chatas e requer um bom planejamento. Assumindo programações em Congonhas ou Guarulhos, temos que sair de casa com uma boa antecedência, levando em conta se é véspera de feriado, se vai chover, se o Corinthians vai jogar ou não, enfim, um verdadeiro jogo de adivinhação para chegar ao aeroporto na hora certa. Com isso, em 99 quando passei a voar fixo na Ponte Aérea, consegui realizar um grande desejo. Além de poder ir para Congonhas de carro e deixá-lo estacionado no pátio da Varig (privilégio que os pilotos da Ponte tinham), passei a ter a opção de ir de bicicleta. Morando no bairro do Brooklin, a cerca de 4 quilômetros de distância do aeroporto, fazia o percurso em 15 a 17 minutos, dependendo dos semáforos das 3 principais avenidas que eu tinha que cruzar. O mesmo percurso, quando feito de carro podia levar de 4 minutos as 6 da manhã ou até mais de meia hora dependendo do horário. Era muito bom ir de bicicleta, amarrava a pequena mala na garupa, calçava um All Star preto e seguia contente para o trabalho. Para não deixar a “magrela” em qualquer lugar sujeita às intempéries do tempo, consegui uma autorização para amarrá-la em um lugar especial, escondida em um corredor sem saída, atrás da sala de um chefe. Lá deixei uma corrente e cadeado em volta de um cano, assim, no caso de eu regressar de vôo e estar chovendo, largava a bicicleta lá para posterior resgate. E o esquema foi melhorado, então consegui um armarinho no vestiário do pessoal da manutenção. Ficou perfeito! Podia manter no armário uma camisa sobressalente, guardar o quepe, e até a mala. Quando chegava um pouco mais suado ou quando ia direto do clube para o trabalho, tomava um banho, colocava o uniforme e seguia para o avião. Nesta época não havia necessidade de passar pelo aeroporto, íamos para os aviões passando por dentro do hangar da Varig, tornando o nosso dia-a-dia de trabalho bem mais fácil. Conseguia sair de casa uma hora antes da decolagem, independente do dia e horário, e chegar ao avião antes mesmo que os demais tripulantes. Um momento gostoso nas minhas pedaladas era quando tinha que sair bem cedo de casa para assumir os primeiros vôos do dia. As seis horas da manhã já estava pedalando por ruas calmas, ouvindo o canto dos pássaros e assobiando com eles. Cruzava por uma feira livre e via o pessoal ainda montando as barracas. No inverno pedalava de gravata, pulôver e uma jaqueta por cima, sendo que na ida eu era mais cauteloso, afinal não podia levar um tombo e chegar sujo ou ralado, em compensação a volta era só alegria. E adrenalina! Voltava em forte pedalada, chegando rapidinho em casa. Onze, onze e pouco, família toda dormindo e eu chegava em casa numa animação só. Certa vez sai de casa um pouco em cima da hora quando a duas quadras de casa percebi que havia me esquecido de colocar o sapato de vôo na mala. Não dava tempo para voltar então fui assim mesmo. Pedi para minha mulher deixar meus sapatos no balcão de check-in da Ponte Aérea. Fui e voltei para o Rio de Janeiro de All Star, e na volta, aguardando o avião estava a despachante com uma sacolinha com o calçado do Comandante! Ir para o aeroporto de bicicleta foi um grande estímulo, era mais um ingrediente para tornar o trabalho prazeroso. Em agosto de 2003 a moleza acabou, pois fui voar nas rotas internacionais, assumindo vôos em Guarulhos e carregando bem mais que uma malinha. Mesmo assim, sempre que tinha atividades em Congonhas relacionadas a ensino, treinamento ou algo do gênero, e não estava chovendo, eu procurava ir pedalando. No ano passado eu me mudei de bairro, agora o percurso de bicicleta leva 40 minutos. Ainda não tive a chance de ir de bicicleta, mas certamente não faltará oportunidade. De qualquer forma, durante uns anos tive bons momentos e contribui com um carro a menos na cidade. Um estilo Chinês-Holandês de ir para o trabalho.

8 comentários:

  1. Roberto, Roberto... seus posts sempre são muito bons ! Adoro investir meus minutos lendo coisas como as descritas acima ! Mais e mais motivação para mim !

    Atualmente vc trabalha pra qual companhia? Continua na VARIG? Está pilotando qual aeronave?


    Grato,


    Danilo.

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  2. Puxa Danilo, não estou querendo associar meus post e meus voo atuais a nenhuma empresa, assim tenho um mais liberdade para escrever o que quizer. Não creio ser difícil supor, baseado nos relatos e nos comentários, aonde estou voando atualmente e em qual companhia. Abç Roberto...

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  3. Amigo Roberto por coincidência conheci o sr quando retornei de sao paulo para curitiba no seu comando um 737-800 (não sei se era FSP) eu estava voltando de uma feira de BIKES, sou gerente comercial de uma fabrica de bicicletas (www.mormaiibikes.com.br) e fiquei maravilhado que o sr. tinha a sua bike como um meio de transporte e pelo fator de gostar tbem, hoje o sr cultua o prazer de pedalar, muito obrigado por mais um post esta quase chegando a seis mil visualisações. Ederson

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  4. E aí comando?! Muito filé o post, eu geralmente quando leio esse seu blog, eu saio de e inacreditavelmente entro na história! Sobre o Allstar esses dias tive essa dúvida. Eu vou pra casamento, formatura e essas coisas, uso Terno e Allstar preto só pra sair da normal. Aí esses dias levantei essa questão com um amigo apaixonado pela aviação também: "Cara, imagina eu pilotando com todo uniforme de piloto e Allstar?!"
    Abraço!!!
    God bless you

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  5. Ah sim Roberto, sim, totalmente, a imparcialidade é uma das vantagens do seu blog ! :D


    Desculpe-me pela pergunta ! Rsrs...


    Abraços!

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  6. Ora, ora! Além de tudo, temos um comandante poeta e romântico! Não é todo mundo que pedala às 6 horas da manhã, para ir trabalhar, assobiando com os passarinhos!
    Adorei seu post.
    I.

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  7. Poder ir trabalhar de bicicleta já é um luxo. Amarrá-la e pilotar um avião é demais!

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  8. Olha.... eu trabalharia uns meses de graça, podia pedalar umas tres horas para chegar no aeroporto, acho que não tem nada mais emocionante de pilotar um 737, sou apaixonado pelos 737 ng e o 737-300 que nao pode faltar na lista, comandante vi seu video em noronha pena que não filmou a curta final mais foi show o visual, quem sabe um dia eu ganho um jump do sr... heheh abraços comandante

    Ederson

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